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. | Foto: Adriano Garib

Na aldeia caótica de hoje não ter opinião virou falta grave. Afinal, não saber o que pensar frente a tantos e tão drásticos acontecimentos não pode ser usado como desculpa para a preguiça de se informar, refletir e se confrontar com quem pensa diferente de nós. Espero, apesar da confusão, que os jogadores tenham a decência de apresentar fatos, argumentos e ideias, o que demanda um esforço considerável. Acontece que essa expectativa não faz qualquer sentido no atual cenário. Já não se usa refletir baseado em fatos comprovados e éticas coletivas.

Nessa inextrincável babel que nos cerca, onde achar diálogos produtivos? As redes socais oferecem menos alternativas do que becos sem saída. O becos são armadilhas onde os jogadores têm a nítida impressão de estarem movimentando suas ideias, apenas porque recebem, como resposta aos seus memes e proposições, imediata e massiva aceitação. Se multiplicarmos isso pelos que só copiam e postam, o resultado é uma hecatombe digital difícil de deter.

A arma é menos nova do que se supõe. Data da década de 1990, ainda no início da internet comercial e antes das redes sociais, quando o engenheiro milanês Geanroberto Casaleggio assumiu o comando da Webegg, firma italiana que prestava consultoria sobre estratégias de comunicação e comércio eletrônico na web. O trabalho desse pessoal era montar intranets, as redes internas corporativas de seus clientes. Nos fóruns internos dessas empresas, a equipe de Casaleggio começou a notar que era possível influenciar debates. A princípio, apenas observavam. Aos poucos, passaram a interferir nas conversas. A título de experimento, uma só pessoa se fazia passar por muitas, no intuito de testar até que ponto seria viável criar resultados com determinadas intenções. Daí perceberam que se muitos repetissem o mesmo ponto de vista, isso gerava uma “avalanche de consentimento”. Tal expressão foi alcunhada como uma infalível estratégia de marketing, mas há pouca novidade nisso. Somos seres gregários: se muitas pessoas concordam, o resto tende a replicar consensos. Com manobras dessa natureza, mostrou-se plenamente possível a manipulação de grupos online para fazê-los chegar as mesmas conclusões sobre um assunto.

De lá pra cá, essa lógica algorítmica perversa viralizou nas redes sociais de modo dramático e irreversível. O roubo de dados de usuários do Facebook pela Cambridge Analytica para influenciar eleitores, a vitória de Donald Trump nas urnas e do Brexit no Reino Unido, as fake news, o uso indiscriminado de bots e trolls, os disparos em massa patrocinados por grandes empresários, toda essa evidente manipulação de consensos ajudou a fazer crescer uma cultura moral cegamente conservadora, exclusivista, raivosa, paranóica, violenta e antidemocrática. Não que isso já não existisse, mas tais práticas sem dúvida deram a voz e a vez a gente pouco disposta ao diálogo.

Logo, se você curte um bom debate em suas mídias sociais, tem apenas três opções, a meu ver: o silêncio, a baixaria ou a bolha. Nas bolhas o tom das conversas tende ao consenso. Por exclusão, a baixaria ou o silêncio é o que resta.

De minha parte, confesso que nenhuma alternativa me agrada. Como a baixaria não me apraz e ainda que o silêncio possa ser considerado uma grave omissão em tempos de aguda polarização, ao menos em redes sociais prefiro me abster do debate.