Há exatos 30 anos, na esquina das ruas Paranaguá e Humaitá, um estudante de Jornalismo pedia carona para o campus da UEL. Parou um Fusquinha verde, dirigido por um professor de Engenharia Civil. O estudante era este cronista de sete leitores; o professor era José Augusto de Queiroz, um dos homens mais admiráveis que Londrina já conheceu.

Dizem que Queiroz morreu na terça-feira, aos 88 anos; pois eu digo que isso não passa de fake news. Queiroz não morreu; está vivo o engenheiro, o professor, o calculista, o projetista, o produtor rural, o pai de família, o amigo. Queiroz vive em cada número que calculou, em cada prédio que ergueu, em que cada projeto que realizou, em cada profissional que formou, em que cada amigo que fez. Vive Queiroz em seu filho e seu neto, engenheiros como ele. Queiroz vive em nós.

Abro a janela da minha casa e vejo a linha de prédios no horizonte: ali está Queiroz, nas inúmeras obras que passaram por sua régua de cálculo. Visito a Folha de Londrina, que acabou de completar 71 anos, e vejo Queiroz na Concha Acústica, cujas formas ele calculou quando era um jovem recém-formado. Caminho pela UEL, e encontro aquele que por 27 anos foi docente da instituição. Contemplo o Lago Igapó, símbolo de nossa amada cidade, e vislumbro Queiroz na barragem que ele projetou há exatos 60 anos. Numa conversa que tivemos, Queiroz me contou que, na madrugada de 10 de dezembro de 1959, ele foi até a barragem só para ouvir o barulho da água do Córrego Cambezinho, que aos poucos formava o imenso lago. No momento em que me contou isso, eu senti que os olhos do velho cartesiano também se enchiam d’água.

“O Homem que Calculava”, de Malba Tahan, foi um dos livros da minha infância. Eu jamais poderia imaginar que, ao entrar naquele Fusquinha em 1989, estava conhecendo o protagonista do livro na vida real. Mesmo dizendo-se cartesiano e pouco afeito à poesia, Queiroz era capaz de comentários dignos de um bom escritor: “Quando Deus expulsou Adão do Paraíso, disse a famosa frase: ‘Ganharás o pão com o suor do teu rosto’. Mas Ele pôs a inteligência na cabeça de Adão, e o homem começou a maquinar contra essa condenação. O engenheiro é o homem que lida com a praga do Gênesis. Ele domina a energia e a coloca a serviço do homem”.

Queiroz costumava dizer que todo sistema precisa de uma referência. Não há templo sem pedra angular, não há trevas sem luz, não há criatura sem Criador. Por isso é que eu digo que ele não morreu: de tanto calcular referências, tornou-se uma — e definitiva.

Você, meu amigo Queiroz, mestre dos números, receba estas pálidas letras como um sinal de agradecimento e reconhecimento. E obrigado por aquela carona.