Imagem ilustrativa da imagem O taxista musical
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— Boa tarde. Tudo bem?

— Boa tarde. Como vai?

— Tudo certo. O sr. é o taxista de vez?

— Sou eu mesmo. Pode entrar.

— Com licença.

— Vamos pra onde?

— Madre Leônia, perto do santuário.

— Então, vamos.

— Por curiosidade: o sr. está ouvindo Offenbach. Gosta de música clássica?

— Olha, não é que eu goste de música clássica. Eu gosto de música boa.

— Poxa vida, parabéns! Hoje em dia é difícil encontrar alguém com esse gosto.

— Está vendo esse pen drive. Aqui tem centenas de músicas, só coisa de qualidade. Tem Bach, Beethoven, Mozart, Brahms, Schubert, Haydn, Villa-Lobos...

— Que maravilha. Nos últimos anos, com a internet, ficou bem mais fácil encontrar essas grandes obras. Antes a gente tinha que ir até a loja de discos ou ficar esperando o programa da Fernanda Jiran...

— É verdade. Estou com 62 anos, mas gosto de música desde jovem, aprendi em casa. E não é só música clássica, não. Gosto muito de música brasileira, não essas porcarias que tocam nas rádios, mas os bons cantores e compositores. Também adoro música americana. Frank Sinatra, por exemplo.

— Ele é ótimo. Ele e a Ella Fitzgerald...

— Gigantes. Sabe, é bom conversar com quem entende de música. Mas não é só música que me interesse. Desde criança eu gosto de ler sobre história e geografia.

— Minha mãe era professora de história e geografia, eu também gosto muito.

— Como taxista, muitas vezes eu conheço pessoas que viajaram pelo mundo. Dias desses, um passageiro havia acabado de chegar da Irlanda, e disse que havia visitado um museu lindo em Glasgow...

— Glasgow?

— Pois é. Com delicadeza, eu disse que ele talvez estivesse confundindo Glasgow com Dublin... A gente sabe que Glasgow fica na Escócia.

— E o sr. já conheceu algum país estrangeiro?

— Não. Nunca saí do Brasil, mas é como se eu conhecesse esses lugares. Outro dia conversei com uma senhora que passou meses na Turquia. Ela ficou impressionada quando percebeu que eu sabia os nomes e as características de cada região. A Turquia é linda... No Brasil, a gente tem a mania de chamar os árabes de “turcos”. Mas isso está errado. São povos diferentes.

Quando chegamos à Madre Leônia, já tínhamos conversado bastante sobre música e geografia.

— Qual é o nome de senhor? — perguntei.

— Samuel. E o seu?

— Prazer, Samuel. Eu me chamo Paulo Briguet.

— Briguet? O do jornal? Foi bom conversar com você!

Quando nos despedimos, tocava a “Aleluia” de Haendel.

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