Imagem ilustrativa da imagem Homem de pijama no bar
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Certa vez, há muitos anos, conheci um homem que ia de pijama ao bar.


Ir ao bar, OK. Colocar pijama, OK. Mas, por algum motivo, instituíram que é condenável ir de pijama ao bar. O homem, porém, estava acima desses regulamentos.


Morava na pensão ao lado do boteco. Provavelmente era sozinho na vida. Às seis horas da tarde, abria a porta da pensão, dava quinze passos e sentava-se a uma das mesas de metal.


Na verdade, o bar era um estabelecimento muito simples, daqueles que têm vidros de tremoço e coxinhas na estufa. Na parede, via-se um aviso metafísico: FIADO SÓ AMANHÃ. Se você voltasse no dia seguinte, é lógico que o aviso ainda estaria ali; e assim até o final dos tempos. Ou seja, aquele pequeno aviso continha uma sentença assustadora: — O tempo não existe.


De pijama, o homem pedia uma cerveja, que lhe era prontamente servida. Bebia em paz e solidão. Não o incomodavam, e ele não incomodava ninguém. Depois de um tempo, dava uma olhada no relógio (sim, ele usava relógio de pulso) e voltava para a pensão.


O pijama era velho como o homem. De flanela, com bolinhas azuis: uma segunda pele. Estava sempre limpo, o pijama, o que não deixa de ser um fato estranho; desconfio que o homem tivesse dois ou três modelos iguais. Ah, também havia as sandálias Franciscanas, com uma quilometragem que possivelmente superava a do Trópico de Capricórnio.

A tarde caía; as pessoas deixavam o trabalho, passavam pelo bar. No canto, à sua mesa predileta, o homem solitário bebia o líquido amarelo e borbulhante. Às vezes, novos clientes o olhavam com estranheza. Mas logo se acostumavam.


Nós estávamos lá, vestidos e munidos com a roupa da vida cotidiana: camisas, calças, sapatos, cintos, blusas, lenços, carteiras, pastas, agendas e até celulares (eram esquisitos os celulares daquela época!). Falávamos de tanta coisa: trabalho, política, esporte, religião, sexo, música, literatura, piadas.


O homem, não. Jamais ouvi uma palavra de sua boca. Talvez fosse mudo. Ele vivia no silêncio completo de um tempo que não era tempo: sua vida era sono, espuma, solidão e memória. Um leve sorriso nos lábios (e me diga: qual é o sorriso que não vem dos lábios?). Uma certeza serena do mais simples. O conhecimento do elementar.


Um dia, venderam o bar, que passou por uma reforma e modernizou-se. Na mesma época, a pensão fechou as portas. Nunca mais tive notícias do homem, do seu pijama e das sandálias Franciscanas. Depois, o bar moderno também fechou as portas, e hoje virou farmácia. (O que me lembra uma frase do Zeca Pagodinho: “Eu bebo pra ficar ruim, se fosse pra ficar bom eu tomava remédio”.)


Que fim levou o homem de pijama? Não faço a mínima ideia. Mas hoje eu resolvi apresentá-lo a vocês sete. Se um dia vier a encontrá-lo em algum sonho, farei a pergunta que sempre quis fazer:


— Que horas são?