Na última semana, rodou nas redes sociais a notícia de que a churrascaria Fogo de Chão teria demitido 690 funcionários e enviado a conta das rescisões para o governador do Rio de Janeiro pagar.

Das sedes que demitiram funcionários, todos o fizeram por redução de custos, mas continuam atuando no mercado, principalmente com o serviço de delivery, não havendo fechamento de unidades.

Este artigo foi justamente o artigo citado pelo presidente Jair Bolsonaro ao contrariar o fechamento de estabelecimentos comerciais pelos governadores estaduais em coletiva de imprensa, quando afirmou: “Tem um artigo na CLT que diz que todo empresário ou comerciante que for obrigado a fechar seu estabelecimento por decisão do respectivo chefe do Executivo (…) Os encargos trabalhistas quem paga é o governador e o prefeito. Tá ok?”

Contudo, entendo que a interpretação dada pela churrascaria Fogo de Chão pende de legitimidade, senão vejamos o que diz o citado artigo:

Art. 486 - No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável. (Redação dada pela Lei nº 1.530, de 26.12.1951)

Apesar do artigo citar que havendo paralisação, mesmo que somente temporária, motivada pela autoridade municipal ou estadual, o governo somente seria o responsável por pagamento de indenização se o fato da paralisação fosse imotivado, mas ao contrário, é fato de que a paralisação se deu por um ato de proteção à vida da população. O isolamento social é defendido fortemente pela OMS como forma de impedir ou reduzir a proliferação do vírus que transmite a Covid-19.

O artigo 486 da CLT define que a Administração Pública não pode deliberadamente causar danos ou prejuízos diretos a terceiros sem contrapartida e, se causar, poderá haver o dever de indenizar.

A dúvida que fica é se os recentes decretos de paralisação de governos e municípios configuram ou não fato do príncipe. Pelo que recomenda-se averiguar se todos os requisitos expostos no artigo 486 estão presentes.

Inicialmente, o artigo 489 exige que para se falar em indenização deve haver a paralisação temporária ou definitiva da atividade. Ou seja, deve haver paralisação de fato.

No caso da churrascaria Fogo de Chão, apesar de não haver atendimento ao público em seus restaurantes, continuou sua atividade através do delivery, o que pode ser observado em seus sites e redes sociais. Assim, não houve paralisação integral de sua atividade.

Outra exigência do artigo citado é a impossibilidade de continuação da atividade. Só cumpri este requisito àquele que, pela paralisação total, temporária ou definitiva, por ato da administração pública, teve seu estabelecimento impossibilitado de continuar sua atuação.

Mais uma vez não é o que vemos no caso aqui analisado. Apesar de demitir boa parte de sua mào de obra, ainda manteve o contrato de trabalho de vários funcionários, manteve também o sistema de delivery e suas unidades físicas intactas. Não houve o encerramento da empresa.

Ora, para ocorrer o dever de indenizar, necessário se faz que a empresa encerre, definitivamente, suas atividades. Assim, empresas que após ou durante a pandemia consigam continuar ativas, não se encaixarão neste requisito, não podendo, portanto, se valer do artigo 486 da CLT.

Ademais, a própria CLT, em seu artigo 2º, entende que o risco da atividade econômica é do próprio empregador e não pode este repassá-lo a terceiro, o que inclui órgão da administração pública. O governo do Rio de Janeiro, no caso da churrascaria Fogo de Chão, só teria que arcar com a indenização caso não tivesse uma justificativa plausível para a interrupção da atividade do citado restaurante.

Conclui-se, então que a situação atual que vivemos, o fechamento de estabelecimentos pelos governantes, não é fato do príncipe para o fim de aplicação do artigo 486 da CLT, sendo que os funcionários do citado restaurante terão muito a discutir na Justiça do Trabalho.

Por Mariana Domingues