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Hoje não basta não ser racista. É preciso ser antirracista, denunciar e combater todas as formas de preconceito e exclusão. O racismo estrutural que nos define como nação está entranhado nas mais sutis maneiras de ser. Por isso, é preciso autovigilância. Quem nunca se viu rindo de piadas racistas? Quem nunca reproduziu o racismo, em gestos ou palavras, sem se dar conta do terrível equívoco? Um espírito livre, acolhedor e crítico requer um olhar atento e criterioso sobre si mesmo.

Uma expressão me apareceu nos últimos dias: “racismo ambiental”. De início, achei estranha. Aos poucos fui percebendo como é pertinente para análises de nosso mundo contemporâneo. O termo foi cunhado em 1978 pelo reverendo estadunidense Benjamin Chavis, por ocasião de uma tórrida luta contra dejetos tóxicos que eram depositados em seu bairro, na cidade de Warren – um bairro, vale salientar, majoritariamente habitado por negros.

Desde então o termo vem sendo empregado para demonstrar que negros, indígenas e minorias étnicas são costumeiramente atingidos por desastres ambientais e políticas de desrespeito ao ecossistema. Em seus espaços de vivência, as vítimas preferenciais do “racismo ambiental” têm cor, encontram-se em condições precárias ou em áreas cobiçadas pelo grande capital. Assim, construções de barragens, a sanha das empreiteiras pelas terras urbanas, a periferização das metrópoles e muitas outras formas desse tipo de racismo assumem o risco de mais violência contra essas populações já tão castigadas numa sociedade marcada pela desigualdade.

Assim como o racismo que inferioriza pela origem étnica, o “racismo ambiental” define quem terá acesso aos direitos de cidadania nas terras que ocupam. Nas cidades, a geografia separa pobres de ricos, pretos de brancos, desejáveis de indesejáveis. Nos lugares habitados pelos indesejáveis, sobra ausência de Estado, de políticas públicas de saneamento, educação, saúde etc. – o Estado só é ali hegemônico quando o assunto são as forças oficiais de repressão.

Vale um esforço para pensar a vida de seringueiros, ribeirinhos, coletores e indígenas sob uma mata amazônica em crescentes chamas. Nunca se queimou tanto a mata como agora. Os efeitos são perversos, desde a fuga de seus ocupantes para as cidades mais próximas até um contingente significativo de males ocasionados pelo componente tóxico das queimadas.

E tudo isso para aumentar terra de pasto, garimpar ouro ou simplesmente faturar algum dinheiro à custa da destruição florestal.

O “racismo ambiental” surge como desdobramento da ideia de superioridade entre seres humanos. Assim como a cor da pele dá ou não acesso aos bens públicos, simbólicos ou materiais, ela também condiciona corpos em espaços urbanos e rurais mais ou menos valorizados. Além disso, as consequências das mudanças climáticas, por exemplo, acabam atingindo aqueles que não têm como se salvar do calor excessivo ou do frio congelante – doenças e carências surgidas do modo predatório com o qual os humanos se relacionam com a natureza também fazem escolhas, perdoam ou matam.

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A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.