Aproveitei o final de semana e fui com minha família ao cinema. Fomos assistir a “Mariguella”, filme de Wagner Moura sobre o líder revolucionário mais importante da história do Brasil. A expectativa para ver o filme durou alguns anos, por conta das dificuldades de pensar diferente num país que tem se acostumado ao binário, ao “preto ou branco” – no fundo, a crise que assola o planeta é mais de ideias do que de qualquer outra coisa.

.
. | Foto: Divulgaçao

Fiz questão de que meu filho fosse ver a produção nacional tão badalada nas últimas semanas. Com 15 anos de idade, João precisa de novas referências, de valores maiores. Carlos Mariguella foi um homem apaixonado pelo Brasil e pela cultura nacional. Não conheceu barreiras para lutar da forma que considerasse oportuna. Viveu e morreu em nome de um ideal que o superava, que foi além da mesquinhez típica dos indivíduos hiperbolizados. Mariguella soube, enfim, como poucos de sua geração, interpretar o Brasil e suas nuances. Esgotou-se em voluntarismo e não cedeu à tentação de desistir. Como ele mesmo dizia: “Não tenho tempo para ter medo”.

Mariguella foi preso diversas vezes, tanto na ditadura Vargas quanto na ditadura civil-militar pós-1964. As acusações que lhe eram feitas eram de subversão. Sempre atento aos movimentos do poder, Mariguella erguia-se contra o autoritarismo e o fascismo, tão presentes na cultura política do Brasil. Foi membro histórico do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e fundador da ALN (Ação Libertadora Nacional), um grupo de guerrilheiros urbanos que apostou na luta armada para derrotar o regime político autoritário que durou 21 anos.

O filme de Wagner Moura retrata os últimos anos de Mariguella. Ele já era considerado o inimigo público nº. 1 da ditadura quando foi preso num cinema no Rio. Preso e torturado, conseguiu escapar à prisão graças à repercussão na mídia de sua forçada reclusão. Dali em diante, “o guerrilheiro que incendiou o mundo” – subtítulo da preciosa biografia de Mariguella escrita pelo jornalista Mário Magalhães – passa a ser constantemente procurado. Aprisioná-lo mais uma vez era uma questão de honra para o regime de exceção no Brasil. Considerava-se o seu confinamento (ou a sua morte) uma etapa crucial na luta contra os subversivos.

A faceta mais inspiradora do filme de Wagner Moura, entretanto, é a aposta no viés subjetivista de Mariguella. Mais do que um revolucionário a tudo disposto, o baiano e neto de escravos surge na tela com todas as sua emoções, seus breves receios, sua enorme capacidade de amar. Como ele mesmo deixou registrado, numa fita endereçado ao filho: “Seja amoroso, leal e honesto”.

Num tempo de tantas barbaridades originárias no governo e na sociedade, “Mariguella”, o filme, é um bálsamo de energia. Saber que existiram pessoas como Carlos Mariguella reacende a esperança num futuro ainda por ser elaborado e construído, no qual suas grandes personagens sejam vistas como realmente são: complexas e humanas, merecedoras de nosso olhar e de toda a admiração possível.

...

A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina.