Notícias recentes dão conta de que em 5 anos o Brasil perdeu quase 800 bibliotecas. O verbo “perder” não é à toa: perde-se muita coisa com o fechamento de bibliotecas. Trata-se de espaços que oferecem serviços indisponíveis em outros lugares, além, é claro, do acervo de livros que costumam guardar o patrimônio de povos inteiros.

Bibliotecas públicas são frequentadas por estudantes, idosos, imigrantes e pesquisadores independentes. Tendem também a abrigar curiosos, pais e filhos, gente interessada em ler ou reler um livro indicado, uma lembrança de outros tempos, um momento marcante na vida. Em seus aconchegantes domínios, as bibliotecas oferecem lugar para estudo, relaxamento e encontros com colegas de trabalhos escolares. Muitas delas disponibilizam salas de vídeo e acomodações destinadas a cursos, oficinas, palestras etc. Em resumo, são paraísos urbanos de cultura, entretenimento e trocas interpessoais.

As melhores bibliotecas são verdadeiros espaços públicos. De modo gratuito, garantem acesso à internet e exemplares de jornais e revistas em circulação, a fim de que todos possam se informar e formar. Em 2019, numa espécie de ano sabático, pude frequentar 2 ou 3 vezes por semana a Biblioteca Pública do Paraná, em Curitiba, onde estudava, encontrava preciosidades literárias, passava as melhores horas dos meus dias na capital. À noite ou nos fins de tarde, encontrava-me com grandes escritores, acompanhava suas apresentações e ficava sabendo das novidades do mercado editorial brasileiro. Vale ainda lembrar do excelente Jornal “Cândido”, que a biblioteca produz mensalmente e distribui a todos os seus visitantes.

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. | Foto: iStock

Os números, como quase tudo na vida não são inocentes nem puros – apontam tendências, caminhos, processos em (des)construção. Ao mesmo tempo que perdemos bibliotecas, ganhamos clubes de tiro. Sob o atual governo federal, o país abriu, em média, 1 clube de tiro por dia. (Sim! Por dia!) Só em 2021, 449 pessoas obtiveram por dia licença para obter armas de fogo. (Sim! Por dia!) É do mesmo país que falamos: onde se pode ler menos, se pode atirar mais; onde menos vida se cultiva, mais morte se semeia.

Não é coincidência que essa falta de “pureza” surja num momento de acirramento das formas de violência política e social. A tolerância – onde se lê pouco – decai, enquanto o ódio – onde se atira muito – cresce de modo exponencial. É fácil perceber quanto tem se tornado obstruída a palavra; o diálogo não encontra percursos possíveis. Do mesmo modo, os afetos negativos se fecham em bolhas, dentro das quais pouco se ouve, só há galhardias, gestos obtusos para desinformar e deformar.

Sujeitos que idolatram as armas não amam os livros, detestam a palavra, fogem do plural convívio humano. A um só tempo, aquele que é apaixonado pela palavra escrita sabe mais do mundo, aprimora sua sensibilidade, está apto a conviver, compartilhar, assumir a responsabilidade aberta sobre tudo que é real, vivo, coletivo. É uma escolha fácil de fazer: se houver mais bibliotecas, ficará mais fácil ainda.

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A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.

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