Aos 28 anos, Clariss Wolff é um dos mais novos nomes da literatura brasileira. A escritora de Porto Alegre mora em São Paulo e assina uma coluna literária na Carta Capital, além de já ter publicado em revistas como Rolling Stones e Cult. ‘Todo Mundo Merece Morrer’, seu romance de estreia, publicado pela Verus editora, foi um dos livros mais falados do segundo semestre de 2018, mas segundo Clarissa, a ficção sempre fez parte de sua vida, muito antes da crítica. “Publicamente essa cronologia faz sentido: comecei a escrever em blogs e a contribuir para veículos em forma de entrevistas e resenhas, e a ficção veio anos depois. Mas no meu mundo privado a ficção sempre existiu. Minha vida de leitora e escritora de ficção sempre estiveram simbioticamente interligadas, e foi a parte de entrevistas e resenhas que surgiu depois”.

‘Todo Mundo Merece Morrer’ não é um livro fácil de agradar qualquer leitor, a forma narrativa que pula de uma personagem para outra, narrador em 1ª e 3ª pessoas, é um desafio, mas deixa o leitor tenso e se perguntando muito sobre o limite do certo e o errado. “Acho que eu estava muito interessada em pensar sobre o quão possível é realmente fazer coisas pra mudar o mundo, “boas ações”. Salvar uma vida seria a melhor ação possível, certo? Mas mesmo assim a gente nunca tem consciência do efeito dominó, pro bem ou pro mal, do que acontece”, conta.

Para Clarissa, o processo de escrita e a inspiração podem ser coisas distintas, mas complementares, “eu vejo a inspiração mais como um estado de espírito, e as coisas que me inspiram são coisas que me ajudam a entrar nesse estado de espírito. Gosto de escrever em um ambiente com referências visuais que eu aprecio, gosto de música, gosto de estar lendo outros livros durante a escrita, são coisas pequenas. E às vezes tem roubos descarados: uma conversa entreouvida no metrô, por exemplo, vai pra história final”.

O livro da escritora além de mistério, incômodo e perturbação, tem uma bela lista de músicas para escutar lendo, assim como referências durantes quase senão todos os capítulos da obra, mas para Wolff, misturar o mundo das artes é algo quase indispensável. “Eu gosto muito de música e por alguns anos trabalhei nessa indústria. Dos 19 aos 22 fiz aulas de canto, estudei teoria e estética musical. Meu marido é músico. Para ser honesta, eu gosto de diversas formas de expressão artística, não só literatura e música. Estudei história da arte, gosto de brincar com aquarela e acrílica em casa, sou apaixonada por dança e ballet. Acho que todas essas formas de expressão artística se cruzam e minha curiosidade faz eu querer mergulhar fundo em cada uma delas. No caso da escrita do livro em si, eu efetivamente ouvi aqueles discos, e cada um me ajudou, de forma bastante subjetiva, a parir as histórias”.

A artista atormentada

A coluna ‘A Redoma de Livros’, assinada por Wolff na carta Capital começou com o Youtube e o título, foi inspirado na obra aclamada de Sylvia Plath, ‘A Redoma de Vidro’. Plath é uma das autoras favoritas de Wollf, uma “obsessão” como conta. “Minha relação com a Sylvia Plath é muito mais pessoal, da Clarissa mulher, do que técnica, da Clarissa escritora. Não acho que ela seja a melhor escritora do mundo, mas acho que ela é a escritora mais “eu” do mundo – e por isso a obsessão vai tão fundo. Agora falando de literatura especificamente, eu acho a Sylvia tem alguns trunfos incontestáveis. Um deles é trabalhar o vazio humano do ponto de vista da experiência feminina, com as subjetividades da expectativa da performance do ser mulher”.

Sylvia Plath é uma das escritoras mais influentes do século XX, seu romance acima citado e poemas, fizeram companhia a muitas jovens mulheres que sofriam das mesmas ansiedades da escritora e de depressão, além de conseguir com sua escrita personificar e mostrar para o mundo muitas das inquietações femininas, como cita Clarissa. “Mas a Sylvia parece quebrar o muro da pureza e do altar da literatura para trazer figuras escatológicas em formato de poesia (nesse sentido, me lembra o Kurt Cobain). Acho que é uma daquelas coisas que ultrapassa a técnica – era realmente uma mente perturbada com a graça da capacidade de transformar isso em arte”.

Além de Plath, como autoras que a inspiram, Clarissa citou nomes como Emily Bronte, Jennifer Egan, Joan Didion, Luisa Geisler, Zadie Smith e Virginia Woolf. Ao citar a ousadia na escrita de Egan, ela conta, “eu nunca pensei que eu teria permissão de fazer algo assim, e sempre sofri tentando encaixar o que eu escrevia numa caixinha do que eu achava que deveria ser um livro – e as coisas que eu escrevia não cabiam lá. “A visita cruel do tempo” abriu mundos inteiros e fez eu perceber que eu tinha permissão de escrever do jeito que eu realmente queria, que eu realmente já escrevia mas achava que era errado”.

Clarissa Wolff também conta que sempre vai escrever independente da publicação de seus livros. Ela se insere no mundo das artes e faz delas um produto só, da literatura sua expressão no mundo, é perceptível na ambição de sua primeira história. E quem ganha com tudo isso é sempre o leitor.