Conversando com minha filha por esses dias falávamos sobre uma atividade que ela fez na escola. A pretensão era ensinar as crianças a serem empreendedores.

Atualmente, elas vivem no celular. Seja jogando, em redes sociais, no YouTube. Por que não aproveitar o tempo livre delas para trabalhar habilidades como trabalho em equipe, resolução de conflitos, habilidades sociais e cognitivas por meio do empreendedorismo, livres do celular?

Minha filha, de tempos em tempos faz pulseiras, chaveiros e brincos para ganhar um dinheirinho. Vende os produtos para familiares e usa o que ganha para comprar gibis da Turma da Mônica. Legal a ideia. Aqui em casa sempre a apoiamos, mas com uma ressalva: a atividade (não chamávamos de trabalho) nunca poderia atrapalhar nos estudos dela, no esporte e menos ainda em ser criança.

Este é o fator mais importante: a criança não pode entender aquilo como uma obrigação, algo que precisa ser feito sob pena, por exemplo, de perder nota na escola. Já não basta nós adultos perdemos noites de sono pensando em como vamos resolver certos problemas do nosso negócio, vamos fazer isso com as crianças também? Meu leitor mais crítico vai pensar: “Não é bem assim. Nenhuma escola vai reprovar de ano porque não fez o trabalho de empreendedorismo”. Por mais que isso não ocorra, questiono métodos pedagógicos que queiram forçar as pessoas a serem o que não querem. Meu leitor mais crítico novamente vem à tona para me dizer: “Ninguém está forçando as crianças. É só uma brincadeira”. Para eles lembro daquela outra brincadeira: “Tô brincando, mas é sério..”.

É muito mais eficaz os pais mostrarem o valor do dinheiro do que querer que seu filho se torne influenciador mirim na internet. É preciso cautela com games e internet porque existem muitos perigos na rede de computadores, haja vista os casos absurdos de exploração de menores, perseguição e até de suicídio que aparecem todos os dias. A regulação brasileira é falha para o ambiente virtual e não podemos expor demasiadamente nossos filhos.

O que ensinamos em termos de empreendedorismo são técnicas de gerenciamento de um negócio, além de determinadas virtudes necessárias ao exercício de vendas, por exemplo. Ninguém nasce empreendedor, mas pode vir a sê-lo. Como já ensinou o mestre Mário Sérgio Cortela, virtude é aquilo que pode vir a acontecer porque está virtualmente contigo em algo. Ao passo que dom é uma característica nata, que vem com a pessoa. Empreendedor nato é aquele que gosta do comércio. Empreendedor com virtude é aquele que aprendeu a negociar para crescer seu negócio.

Vendendo e trocando produtos que as crianças mesmas elaboram é uma maneira bem mais eficaz e inteligente de ensiná-lo a, por exemplo, calcular o valor de algum produto ou serviço e até a lei da oferta e da procura.

Incentivar o empreendedorismo dos pequenos é uma boa ideia, mas precisa ser do jeito certo.

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Lucas V. de Araujo: PhD em Comunicação e Inovação (USP).

Jornalista Câmara de Mandaguari, Professor UEL, parecerista internacional e mentor de startups.

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