É evidente que as preocupações demonstradas pelos dirigentes da Vale e as providências imediatas já tomadas pela empresa, depois do desastroso crime ambiental de Brumadinho, se devem à nova ordem governamental instalada no País há um mês. Sabe a mineradora que agora a lei dos ajeitamentos e da protelação já não vigora e que cobranças e punições já estão acontecendo. Fossem outros os tempos, o descaso se repetiria, como já se viu com a demora para indenizar as vítimas de Mariana que ficaram desabrigadas e nenhuma medida para reforçar a segurança das demais barragens. O governo do Estado de Minas Gerais e o governo federal eram petistas.

Antes era a Samarco e agora é a poderosa Vale, uma das maiores empresas brasileiras, ainda estatal em grande parte, embora a privatização administrativa. Seu presidente já ordenou a eliminação de todas as barragens com características semelhantes à que agora ruiu. Ao mesmo tempo determinou a imediata doação em dinheiro às famílias das vítimas. E quanto às indenizações, a empresa também ordenou que elas sejam pagas independentes de ações judiciais.

Várias e pesadas multas já foram impostas, enquanto se anuncia o endurecimento na concessão de novas barragens. Dois engenheiros e três funcionários da Vale já foram presos. Segmentos da sociedade pedem a prisão também de Dilma e Pimentel, o então governador de Minas, que autorizaram a expansão das atividades da mineradora sem as necessárias exigências de proteção ambiental e da população circunvizinha. Não houve monitoramento e começa-se a pensar na tradição de que concessões ocorriam frequentemente mediante propinas. Doravante as leis de segurança das barragens serão revistas.

Essas novas medidas emergem das próprias mineradoras, mesmo com os prejuízos financeiros que advirão pela diminuição da produção, embora se aposte na compensação pelo aumento de preços na comercialização dos minérios. Os municípios envolvidos também perdem, porque diminui o volume de royalties ambientais, e os acionistas temem por eventuais quedas no valor das ações da Vale. A crença de que, doravante, as leis irão funcionar é que está gerando toda essa corrente de medidas saneadoras, o que não aconteceu com o episódio de Mariana e não era comum em tantos casos e que se exigia a pronta ação do sistema então em vigor.


WALMOR MACCARINI, jornalista


SUS: universalidade, integralidade e equidade

No Brasil, a atenção à saúde é integral e universal. A Constituição de 1988 determina ser responsabilidade do Estado assistir o direito de todos os 207 milhões de cidadãos em relação às suas necessidades de saúde.

Evidencia-se, cada vez mais, tendência a omitir o princípio da "integralidade", amiúde substituindo-o por "essencialidade", isto é, o básico ou o mínimo.

Há ainda inversão do princípio da equidade. Esta implica em oferecer mais a quem tem menos e menos a quem se encontra em melhor situação. Longe disso, distribui-se igualmente os parcos recursos a quem tem e a quem não tem. O ressarcimento ao SUS pelo sistema suplementar está longe de ser relevante.

As mais de 207 milhões de pessoas que vivem no Brasil têm todas, e sem exceção, assistência gratuita e integral à Saúde, garantida pela lei máxima do País. Entre eles, inclui-se um contingente de 45 milhões também assistidos pelo sistema de saúde suplementar.

A distribuição desses últimos 45 milhões alcançados pelos planos de saúde não acompanha a população brasileira, mas concentra-se nas regiões mais desenvolvidas do País. Há 1.276 operadoras atualmente com registro na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), sendo mais de 75% delas nas regiões Sudeste (61%) e Sul (15%).(CNES, jan 2018)

Não poderia ser diferente, visto que constituem, em expressiva maioria, empregados nessas áreas do País e nas grandes capitais. De fato, sua distribuição geográfica tende a acompanhar o desenvolvimento socioeconômico do Brasil. Em outras palavras, o sistema suplementar é mantido por pessoas que podem fazer face ao investimento representado por seguros e planos de saúde.

Seria simplificação descabida resumir em SUS e sistema suplementar as desigualdades em atenção à saúde prevalentes em nossa nação. Há imensas diferenças regionais na qualidade e no número de serviços de Saúde disponíveis no sistema público e, da mesma forma, há discrepâncias abissais entre seguros e planos de saúde no que tange à qualidade da assistência oferecida.

Argumentam outros em favor de planos de saúde "populares", não visando senão atender aos interesses de grupos voltados à exploração de segmentos populacionais mais desfavorecidos, que talvez possam suportar planos mais baratos e, assim, encontrar alternativa ao SUS deficiente.


JOSÉ LUIZ GOMES DO AMARAL, presidente da Associação Paulista de Medicina