Embora acostumado ao verão de Londrina, não foi fácil suportar as altas temperaturas dos últimos meses. Dizem que foi o janeiro mais quente dos últimos quarenta anos e, por onde andei, só ouvi gente reclamando da falta de chuva, procurando ambientes com ar-condicionado.

É sempre assim: quando faz calor ficamos perguntando quando é que vai começar o inverno e quando chega o frio ficamos lembrando como são bons os dias de verão. Ainda existem aqueles que afirmam que o ano deveria ser sempre primavera, enquanto outros alegam que, devido ao aquecimento global, não há mais distinção entre as estações.

Estava pensando nessas coisas e nas dificuldades que a população enfrenta quando ocorre falta de água, tendo sido interrompido pela chamada telefônica do amigo José Matias convocando para ajudar na instalação de um monjolo em sua propriedade rural localizada no distrito de Maravilha, à margem do rio Tibagi. Durante a conversa ele contou que após vários meses havia conseguido autorização para utilizar a madeira de uma árvore derrubada por um temporal. Adiantou que estava quase tudo ajeitado, pois já tinha feito as peças necessárias: eixo, pilão, cuba e soquete, precisando de ajuda apenas para montar a engrenagem.

Conforme combinado, naquele sábado saí de casa bem cedo para fugir do calor e aproveitar o dia. Quando cheguei ao lugar eram sete e meia da manhã e não encontrei o Zé Matias, pois ele tinha ido até o sítio vizinho buscar mais gente para ajudar na empreitada. Enquanto isso, fiquei andando pelo sítio de onde se tem uma vista espetacular do rio, com seus remansos, ilhas e corredeiras. Curioso em saber das melhorias que o Zé Matias disse que tinha feito no sítio, fui ver a mina d'água que brota atrás do bambuzal, ciente de que o sujeito que tem uma nascente de água potável dentro da propriedade é dono de um privilégio, é um abençoado.

Fiquei impressionado pelo capricho que o Zé Matias dedicou à proteção da nascente, contribuindo para tornar ainda mais belo aquilo que a natureza criou. Ele aproveitou o declive do terreno e construiu uma canaleta para favorecer o deslocamento da água e fazer girar uma roda d'água vinte metros abaixo da nascente. E o mesmo volume de água que move a roda foi direcionado por meio de outra canalização, mais extensa, para o local onde seria instalado o monjolo. Não sei mensurar quanto tempo fiquei por ali aproveitando o frescor da mata e admirando a roda d'água e só voltei à realidade quando ouvi as vozes do pessoal que o Zé tinha ido buscar.

Com o mutirão feito pela vizinhança, em torno do meio dia o serviço estava pronto e dava gosto de ouvir o barulho da água movimentando a engenhoca. Era engraçado observar a alegria daquelas pessoas a contemplar um maquinário tão rudimentar em funcionamento. Devia ser a lembrança de outros tempos e lugares, quando os monjolos faziam parte da paisagem rural. Ainda interessado no assunto, foi prazeroso verificar que a água movimenta a roda e o monjolo, segue em direção ao córrego dos jabutis que passa na divisa do sítio e deságua no Tibagi. Tudo ecologicamente correto.

Naquela noite dormi no sítio e pela manhã, enquanto tomava café com a família do Matias, agradeci por ter ajudado a preservar o que eu chamei de "patrimônio cultural da roça". Mas assim como existem pessoas que apreciam um dia de calor e outras que gostam do frio, estou dividido entre o monjolo e a roda d'água. Fico horas matutando e não consigo definir qual é o mais bonito.

Imagem ilustrativa da imagem Monjolo ou roda d'água?
| Foto: Patrícia Sagae




Gerson Antonio Melatti, leitor da FOLHA.