O Brasil tem um carnaval mais silencioso. A alegria está contida nas telinhas, nas lives, para todo mundo brincar em casa. Preparou a serpentina, o confete, a fantasia? Se não , faça isso pelas crianças ou mesmo pelos adultos que não aguentam passar fevereiro sem o som de um tamborim.

2021 é o ano do carnaval do isolamento necessário. Em 2020 ainda sambamos sem saber que, talvez, o vírus já estivesse disfarçado na folia. Veio março, surgiram os primeiros casos comprovados de covid-19, e o País começou a entrar em isolamento, embora de forma relutante, até chegarmos aos dias de hoje, um ano depois, cientes de que sem distância social não haverá solução, pelo menos enquanto não houver vacina para todos, tema que certamente vai inspirar marchinhas.

Não é a primeira vez que o Brasil passa a data sem carnaval de rua. Em 1918, a gripe espanhola também impediu a folia. A epidemia deixou entre 20 e 35 mil mortos no País, em números imprecisos, mas bem menores que os atuais 234 mil mortos, contados até a última quinta-feira (11). Mas em 1919, depois que a danada da gripe passou, nem queiram saber: os brasileiros foram para as ruas para cantar e sambar, numa alegria de quem fazia a revanche do carnaval sufocado do ano anterior.

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. | Foto: iStock

A gripe espanhola atingiu em cheio o Rio de Janeiro, na época a capital mais sacrificada pela epidemia. A cidade também eclodiu na "revolta da vacina", numa semelhança que não é mera coincidência com o negacionismo de hoje. Mas à medida em que os mortos eram empilhados nas calçadas , a população foi entendendo que se tratava de "vacina ou morte!"

Mas em 1919, depois do "carnaval mortuário, veio o carnaval libertário", como historiou o cronista Carlos Heitor Cony. Na época, os cariocas ainda não tinham as escolas de samba, mas os desfiles de rua, com os corsos (carros enfeitados) e foliões fantasiados, já faziam a festa que se tornaria " a maior do mundo" nas décadas seguintes.

O fato é que o carnaval libertário de 1919 foi também o carnaval da ressurreição. E aconteceu com uma força nunca vista com milhares de pessoas nas ruas. Com a epidemia, os costumes também tinham mudado, as mulheres se davam a liberdade de brincar mais à vontade e se fantasiaram de enfermeiras como mostram as foto de época. Mas a fantasia mais popular foi a de espanhola, numa referência à gripe , que só teve este nome não porque tenha surgido na Espanha, mas porque este foi o primeiro país a noticiar na imprensa, sem censura, o surgimento da doença que mataria milhares de pessoas no mundo.

Mas vamos falar de esperança e desejar que em 2022 estejamos aqui celebrando o carnaval como se deve. Preparem o grito, ensaiem o samba, desta vez dentro de casa. No ano que vem teremos outra ressurreição no carnaval e não apenas as cinzas sopradas pelos ventos deste ano sem alegria.

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