"Gostoso é pipoca, parque de diversão, praia, transar sem compromisso. Mas amor, amor dói."

No segundo episódio da série "Vale tudo com Tim Maia", que acaba de estrear na Globoplay, o cantor e compositor diz mais ou menos isso, ao falar de seus amores e frustrações.

O "pai do soul brasileiro" condenou-se ao mal de amor desde a adolescência. Por rejeição ou abandono nunca se sentiu aquele cara capaz de seduzir as mulheres nem manter relacionamentos.

Em outro trecho da série justifica sua infelicidade numa entrevista à Bruna Lombardi: "Tenho até mãos bonitas, pés bonitos, uma cara bonitinha. Mas do pescoço ao peru (sic) sou enorme. Não sou aquele cara gostosão que atrai as mulheres." A declaração, copiada aqui em frases aproximadas, revela um homem sensível e triste com sua condição de mal amado.

Mas Tim não era só choradeira. Pegava suas desilusões e transformava em músicas. "Azul da Cor do Mar", um de seus maiores sucessos, foi composta num quartinho, no apartamento que dividia com o cantor Fábio que na época havia estourado com a música "Stela". Tim compôs "Azul da Cor do Mar" olhando uma foto com uma moça bonita de biquini e o mar ao fundo, tudo pronto para uma cena de amor, só que não. Ele se sentia incapaz de amar e ser amado, "gordo e mulato", como costumava dizer, amargou muita solidão e se comparava intimamente aos rapazes felizes e bem amados como Fábio, expressando isso na música: "E na vida a gente tem que entender/ Que um nasce pra sofrer/ Enquanto o outro ri."

Na real, Tim Maia também ria das próprias desilusões. Gaiato, punha as mãos na cabeça, com dedos esticados como se fossem chifres, quando comentava suas decepções. Repetia que era especialista em "cornologia" quando falava de quantas vezes foi traído. Mas que atire a primeira pedra, quem nunca amargou uma sofrência depois daquele amor virar fumaça.

Na literatura universal há milênios de sofrência e decepções amorosas. Nos clássicos gregos temos aquelas paixões incendiárias entre deuses e mortais. Talvez venha daí a mania de encarar como "deusa" a mulher amada ou tratar como deus o homem que consideramos divino até perceber que não chega a tanto. Mas até aí: Ai!!! Quanta dor, quanta revolta e até maldição na tentativa de se vingar "daquele desgraçado" que te fez sofrer

Olhando as ruas do tempo, a fila de meus amores dobra a esquina. Na maturidade perdi um tanto daquele romantismo e até rio das próprias desgraças. Mas há muito drama transbordando de nossas emoções quando nossos amores ganham contornos de novela mexicana e os séculos de amor romântico que atravessam livros, filmes e músicas nos fazem acreditar que "amar é sofrer". Só que não.

O amor para ser intenso não precisa judiar tanto, a gente pode se apaixonar sem querer se jogar no precipício quando termina. O melhor sentimento em relação a um amor que acaba é a gratidão. O que seria de nós se não tivéssemos amores, mesmo os que frustram? Seríamos aquela fonte que secou, o rio que não chegou ao mar, a nuvem que se dissipa sem nenhum encontro. De meus amores sempre sobram alguns poemas. A melhor resposta ao "desgraçado" é transformar a dor de amor em alguma coisa criativa que te aquece o peito outra vez: uma obra só sua, uma conquista independente, um drama que vira quase comédia. É o que nos ensina Tim Maia, o especialista em "cornologia", que perdeu o amor, mas nunca o humor.

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