Vivemos o tempo dos 'digital influencers', incensados nas mídias sem que ninguém questione conteúdos. Em tempos sem responsabilidade e sem fiscalização, testemunhamos o aparecimento de barbáries na forma de desafios, como o da Baleia Azul, que induzia jovens ao suicídio, ou agora o Quebra-Crânios, que consiste em dar rasteiras em pessoas de modo que caiam de costas e batam a cabeça no chão. Uma jovem de Mossoró (RN) morreu em novembro em função da “brincadeira”.

Com o advento das novas tecnologias, tinha a esperança que o mundo desse um salto. Hoje, constato que o salto não leva só adiante, mas para trás, quando não termina em fatalidade. Até quando vamos estimular 'youtubers', 'digital influencers' e outras 'celebridades' das redes a adoecerem gerações sem a menor noção do que seja ética?

De tempos em tempos, uma “brincadeira” nova deixa vítimas sobretudo entre os jovens que pouco se dedicam a outras atividades, além de digitar em celulares. Livros passaram a ser coisas obsoletas, embora haja toda uma campanha séria por leitura. Jornais, mesmo em suas versões digitais, também não atraem leitores na proporção do empenho com que a informação é produzida com ética e critérios.

Em detrimento disso, sobram memes e até pessoas que se comportam como verdadeiros milicianos da “moral e dos bons costumes” postando vídeos caseiros para constranger pessoas; sobram políticos despejando fake news nas redes e nenhuma plataforma, com potência e alcance internacional - além de milhões de dólares em suas contas - se responsabiliza pelos estragos nas vidas pessoais ou de coletividades prejudicadas por abusos.

Qualquer pessoa preocupada com isso não tem respostas para questões urgentes como a propagação de “desafios”, mentiras, engôdos ou calúnias nas plataformas e redes que para muitos se transformaram em canais de fofocas, perseguição ou paranoias. Que falta faz a educação básica! Que falta faz a educação básica digital. As escolas deveriam implementar esse tipo de educação – não só sob o ponto de vista técnico, mas de conteúdos - num país que recorre às redes para todas as suas vitórias e fracassos, ensinando a todos, desde criancinhas, que ser youtuber é a “profissão do futuro”, mesmo quando o jovem só sabe dizer: “E aí, galera?” no começo e ao fim de cada vídeo.

O novo terrorismo virtual se chama Quebra-Crânios, mas isso significa que cérebros foram quebrados há muito mais tempo. As plataformas gigantes devem ser cobradas pelo que hospedam. Mas a cada vez que fazemos uma denúncia de postagens com conteúdo de ódio, violência, racismo e preconceitos, no máximo recebemos uma resposta fria, quase sempre informando que “não, este conteúdo não fere as regras da comunidade”.

Até quando o abuso será ignorado por autoridades e governos que também se valem de fake news para se manter no poder? Até quando as pessoas serão ludibriadas e deslumbradas por meios eletrônicos que podem deflagrar não apenas conteúdos positivos, mas espalhar preconceitos e levar à morte. Há 30 anos, ouvíamos falar de grupos de malucos que praticavam a roleta-russa, disparando armas com uma única bala na cabeça. Se o azarado girasse o tambor ao ponto onde estava a bala, morria ali mesmo, na mesa da “diversão”, diversão à custa de vidas. O que vemos hoje, com desafios como o Quebra-Crânios, é uma espécie de roleta-russa de difusão eletrônica, de fácil acesso e sem nenhuma fiscalização. Muitos choram pelos mortos, mas quem se responsabiliza por eles?