O Surrealismo faz 100 anos neste mês de outubro.

Inserido nas vanguardas europeias, nascido entre as duas grandes guerras, essa corrente artística teve como precedente o Dadaísmo, liderado pelo poeta romeno Tristan Tzara, mas ganhou autonomia com os manifestos do pensador e poeta francês André Breton.

Em 1º de outubro de 1924 foi lançada a revista "Surrealism" contendo um manuscrito, mas em 15 de outubro do mesmo ano foi lançado por Breton o Primeiro Manifesto Surrealista.

Na arte e na literatura, o Surrealismo propunha um tipo de liberdade que implodia limites para abrir as portas da imaginação, rompendo barreiras rumo a um processo de criação que abarca, por exemplo, a escrita automática. Essa forma libertária, seguindo o fluxo do pensamento, deu origem a uma aventura criativa sem medidas, critérios pré-determinados ou autocrítica pressuposta.

O Surrealismo é contemporâneo das teorias de Freud que tomam corpo dando origem à Psicanálise, revolucionando a forma de compreensão dos desejos e impulsos humanos, levando em conta o inconsciente - até então desconhecido - os sonhos, o poder das imagens e, sobretudo, abrindo a existência como uma condição poética quando o mundo agonizava sob o realismo bruto entre a Primeira e a Segunda Guerra.

Dá para supor a necessidade de um respiro naquele momento, uma abertura que superasse o horror. Até por isso, o Surrealismo também absorveu um conteúdo político presente em seu Segundo Manifesto, escrito por Breton em 1930.

Este segundo texto deixa clara uma cumplicidade política com o marxismo, o que coloca o Surrealismo num caminho que vai além da expressão artística para se colocar como força engajada frente aos conflitos da realidade. Trata-se de um sopro libertário que no Segundo Manifesto dá ao Surrealismo uma abordagem de guerrilha.

Num dos pontos mais envolventes deste Segundo Manifesto, Breton preconiza: “Nós combatemos sob todas as formas, a indiferença poética, a distração artística, a pesquisa erudita, a especulação pura, e não queremos ter nada em comum com os economizadores de espírito.” E também afirma: “O surrealismo se considera indissoluvelmente ligado à marcha do pensamento marxista."

A postura de Breton provocou cisões no movimento. Mas seja pela via estética ou pela via política, o Surrealismo é libertador por espanar a poeira social, política e cultural, inspirando um alinhamento indissolúvel de vida e arte.

Ao considerar a arte um caminho de liberdade irrestrita, abarcando inclusive a obra dos considerados loucos e dos alienados da sociedade, como os presidiários, o Surrealismo implodiu parâmetros que colocavam obras artísticas amarradas a cânones que limitam a criatividade dentro de um espectro de "normalidade" ou padrão estético social e culturalmente aceitos.

Na literatura, nomes como René Crevel, Robert Desnos, Benjamin Péret e do próprio Breton são eternos como paradigmas de vanguarda, assim como Salvador Dalí, Francis Picabia, Max Ernst, Pablo Picasso e René Magritte nas artes plásticas.

Ao alinhar arte, vida e atitude o Surrealismo celebra a existência como uma implosão criativa, uma espécie de Big Bang da expressão humana e cósmica.