A cidade de vidraças embaçadas, vultos mal vestidos e ruas onde baixa a neblina, ganha atmosfera artística neste mês junho quando começa o FILO - Festival Internacional de Londrina.

Aplausos chegam aqui pelas décadas, pulam muros do tempo, cortinas que se abrem ao terceiro sinal quando, magicamente, corpos conhecidos e desconhecidos ganham expressões teatrais e começa uma aventura de outro mundo.

Entrar no teatro nos aproxima da filosofia e da poesia, costuradas num texto ou nas linguagens sem palavras. Um Pirandello que se levanta da poltrona escura, um Shakespeare sacudindo a poeira, Dario Fo revelando mistérios de trás pra frente. E o teatro nacional, sem Molière, continua desnudando as noivas de Nelson Rodrigues, mas casa-se com tupinambás, como mostra a diversidade do FILO 2023 no qual culturas e migrações se cruzam, numa temática que aponta os deslocamentos humanos em situações extremas.

No teatro brasileiro há uma força que me arrebata desde "O Rei da Vela", nas fronteiras oswaldianas que Zé Celso penetrou tão bem que vi como se copula com a arte e com os mistérios gozosos. Porque o teatro é sexy, filho das bacantes, o teatro é quente, o teatro é um êxtase porque nos transforma mesmo na plateia, de onde ninguém sai igual. O teatro é aquela provocação que rasga nossa roupinha de domingo.

Senhoras e senhores, está aberta a temporada que põe mais arte e palhaços na rua. A temporada na qual engolidores de fogo e malabaristas dos semáforos não podem ser punidos pela CMTU. Na verdade, não poderiam em qualquer mês do ano. Mas o festival nos dá a chance de rasgar o verbo.

Que Londrina - Cidade dos Festivais, como a batizei num sopro de inspiração pagã, respire a arte. E que a arte nunca seja confiscada em sua cidadania.

Que a resistência do FILO - esse velho de guerra, aos 55 anos - seja também nossa resistência no mês em que o frio trinca ossos e o teatro nos aquece.

Pulem o muro. Evoé!

Vida longa aos festivais!

* A opinião da colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.