Os dias frios com o Festival Internacional de Londrina acontecendo nos teatros e nas ruas é uma imagem icônica da cidade. Há décadas, junho marca o início do Festival Internacional de Londrina, julho, o Festival Internacional de Música, dias em que a multidão cria outro movimento, principalmente noturno, com filas nas portas dos teatros, um movimento agora retomado após a pandemia.

Cidades do interior enfrentam mais dificuldades para fazer cultura, não é fácil se equiparar a capitais que têm bem mais recursos, da iniciativa pública, privada e do próprio público pagante. Não deixa de ser uma ousadia, uma cidade teimosa manter festivais durante décadas, eventos que se multiplicaram em tantos outros, criando uma capilaridade artística que vai da música erudita ao hip hop, do teatro clássico à palhaçaria nas praças, onde o público, de casacos, cachecóis e gorros, aquece o corpo e a alma em mais um inverno.

Aos 52 anos, o Filo mantém uma programação que dificilmente Londrina teria sem o olhar dessa curadoria. Este ano, o festival traz "Stabat Mater", de Janaína Leite (São Paulo), um espetáculo inspirado num texto teórico da filósofa, feminista e psicanalista Julia Kristeva que aborda um dos temas contemporâneos mais urgentes: a questão da mulher, dentro de uma temática supostamente inconciliável como a maternidade e a sexualidade.

A reconhecida dramaturga, atriz e diretora mineira Grace Passô também marca presença com um espetáculo solo que aborda o corpo e o discurso das mulheres: "Vaga Carne", no qual discute a identidade e a construção social do feminino. Em estreia nacional em Londrina, tem o espetáculo "Esperando Beltrano", do Centro Teatral e Etc e Tal (Rio de Janeiro), que faz uma crítica divertida ao teatro contemporâneo.

Além deste apanhado para o público adulto, que busca o teatro como lugar de reflexão, não faltam as atrações lúdicas para todas as idades, reunidas nesta edição em pelo menos cinco espetáculos, alguns gratuitos.

Um olhar crítico sobre o movimento cultural na cidade, pode pontuar as pulgas na juba do leão. Para quem está do lado de fora sempre parece muito fácil fazer o que faz quem está por dentro. Mas uma combinação de desejo e superação é evidente nestes tempos obtusos para a cultura e permeia as ações artísticas na cidade.

Este ano, o Filo conta com recursos exclusivos do Promic - Programa Municipal de Incentivo à Cultura - para exercer o que é tão vital quanto as verbas: a perseverança e a criatividade para manter uma das coisas que Londrina melhor produz historicamente, a cultura. E isso não se reduz a eventos, mas a uma produção artística local que dura o ano inteiro.

A quarta geração do público dos festivais que deverá lotar os teatros nestes dias - juntamente com os que têm 60, 70 ou 80 anos - é a melhor prova de que a arte avança quando é uma ação teimosa e estendida, no tempo e no espaço, numa cidade do interior que ousa brilhar em cena.
...
A opinião da colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.

Receba nossas notícias direto no seu celular, envie, também, suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link