Na última quinta-feira (8), a poeta norte-americana Louise Glück venceu o Prêmio Nobel de Literatura. Dentre 117 homens premiados desde 1901, quando o prêmio foi instituído, Louise é a 16ª mulher a ganhar o troféu. O disparate numérico causa questionamentos ainda mais se tratando de um prêmio europeu, continente no qual a revolução feminina teve relevância maior que em nosso país. Nem por isso, as herdeiras de Simone de Beauvoir, considerada uma das autoras mais celebradas do século 20, tiveram a mesma “sorte” dos 117 homens.

Quando se fala em direitos das mulheres e dos negros - nos processos de equivalência social, histórica e cultural - tem sempre quem venha torcer o nariz, apontando pesquisas colhidas como agulha em palheiro, para comprovar que a desigualdade inexiste ou não passa de "mimimi" de alguns movimentos culturais.

Louise Glück
Louise Glück | Foto: Marco Jacobsen

O Prêmio Nobel de Literatura – considerado um dos mais importantes do mundo - também é parâmetro para comparar a número de autores brancos premiados em detrimento dos negros. Entre as mulheres, apenas uma autora negra foi premiada até hoje, a norte-americana Toni Morrison, falecida em 2019, que levou o prêmio em 1993. Entre os autores negros, apenas dois foram premiados: o nigeriano Wole Soyinka em 1996 e Derek Walcott, de Santa Lúcia, em 1992.

Será que mulheres e os negros têm menos talento, não sabem fazer poemas ou escrever boas histórias?

A literatura mostra que isso não é verdade, ainda assim poucas autoras nacionais também receberam o devido destaque por sua obra e bem poucas chegaram a receber prêmios internacionais, dentre elas Lygia Fagundes Telles, agraciada com o Prêmio Camões de 2005, instituído em 1988 pelos governos de Brasil e Portugal. Ou a autora de livros infantis Lygia Bojunga que ganhou um prêmio Hans Christian Andersen, considerado o troféu internacional mais importante do gênero. A celebrada Hilda Hilst, também considerada uma das autoras de língua portuguesa mais importantes do século 20, nunca ganhou um prêmio internacional, embora tenha sido premiada no Brasil pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) em 1977 e pelo Jabuti em 1983 por sua obra poética.

As comparações feitas a partir dos gêneros não se limitam a uma colocação sexista na literatura, mas é notório que as mulheres começaram a ser levadas mais em consideração a partir do momento em que as discrepâncias foram mostradas. Prevalece a máxima de que ninguém é notado se não fizer barulho diante da incompreensão generalizada que ainda dispensa tratamento desigual para homens e mulheres em muitos segmentos. E os números estão aí para mostrar que as diferenças gritantes não são uma "invenção" de movimentos culturais.

Este ano, além de uma poeta ganhadora do Nobel de Literatura, temos duas mulheres que ganharam o Nobel de Química, Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna, além da ganhadora do Nobel de Física, Andrea Ghez.

Foi-se o tempo em que as mulheres precisavam se esconder atrás de pseudônimos masculinos para ter algum prestígio, cada vez mais elas ocupam seu espaço escrevendo poemas e romances, além de pesquisar buracos negros e mapear genomas. Isso não teria acontecido sem a batalha daquelas que, há séculos, anunciaram uma revolução de costumes correndo todos os riscos até na hora de reivindicar o direito ao voto.