O Brasil deveria fazer minutos de silêncio pela tragédia que ocorre no Pantanal. E também fazer muito barulho. Na semana em que o bioma se transformou em cinzas devíamos meditar sobre cada animal morto ou em agonia, pelo desespero dos jacarés lentos, pela dor das onças-pintadas que correm com as patas queimadas, pelas macacas que abraçam os filhotes e morrem com eles como mães cuidadosas.

Os pantaneiros choram, o resto do Brasil vê a tragédia de longe e tem quase sempre uma consciência fraca sobre o que está acontecendo, uma consciência de moribundo que já não reage. Um dos maiores patrimônios naturais do país foi consumido pelo fogo, até a quinta-feira (17) foram 2.916.000 hectares devorados pelas chamas, o que corresponde a 19% do bioma que, proporcionalmente, correspondem a 19 cidades de São Paulo.

Várias ONGs - aquelas organizações não governamentais perseguidas e humilhadas pelo presidente - se dispuseram a enfrentar o fogo, improvisaram brigadas de incêndio pondo a vida em risco, criaram frentes de biólogos e veterinários que estão recolhendo animais feridos. Esta semana, a foto de uma onça-pintada abatida, com as patas enfaixadas por causa das queimaduras, correu o Brasil.

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. | Foto: Marco Jacobsen

A pintada é aquele animal que estamparam na nossa nota de R$50, um símbolo que hoje agoniza como o resto do país porque não basta homenagear a fauna em notas de dinheiro, é preciso amar a vida com sinceridade. O lobo-guará, que hoje estampa as notas de R$ 200, é uma espécie vulnerável, só não é considerado em extinção porque sua distribuição geográfica é grande o que lhe garantiu sobrevivência. O gato-mourisco e o gato-maracajá não tiveram a mesma sorte, estão quase extintos. Já a arara-azul pequena foi extinta, a última visualização da espécie foi há mais de 80 anos.

As reservas ambientais, tão desprezadas pelos governos neste momento, são santuários da vida selvagem, assim como as reservas indígenas. Quando me perguntam: "pra que tanta terra para índio?", percebo que o ignorante só enxerga o valor monetário da terra. A preservação ambiental num planeta de 7,75 bilhões de habitantes, segundo estatísticas de 2019, é crucial para manter o equilíbrio. E quando fazemos as contas, como bem observou meu filho, só pensamos na espécie humana, quando o planeta conta com milhares de espécies com quem devemos dividir a terra e a água, os alimentos, o sol e a sombra. Mas para muitos essas vidas não contam, como não contaram no momento em que riscaram o primeiro fósforo para incendiar o Pantanal.

A perícia da Polícia Federal aponta ação humana como origem das queimadas que se transformaram num crime ambiental. Cinco fazendeiros do Mato Grosso estão sob investigação, foram alvos de mandados de busca e apreensão. Um deles foi preso em flagrante por posse irregular de armas e munições.

Esse Brasil armado faz parte da tragédia do momento. A onça-pintada da cédula de R$50 não pode ser apenas símbolo de uma economia fajuta que na realidade não colabora para sua preservação, mas explora, mata, incendeia. Que as imagens tristes dos animais morrendo por ganância humana sirvam, ao menos, para despertar a consciência dos homens de boa vontade, aqueles que também estão em extinção. É preciso ver a vida e não só o lucro na terra. É preciso preservar a onça e o lobo-guará, não apenas usá-los como recurso de merchandising falso nas notas de um país destruído.