Em 2015, um importante pensador contemporâneo deu uma declaração que causou polêmica: “As redes sociais deram voz a uma legião de imbecis.” A frase radical trazia a constatação de um estudioso e crítico das tecnologias de comunicação, o italiano Umberto Eco, que faleceu em 2016, deixando para a história uma observação importante.

Eco foi autor de livros que estudantes de Comunicação têm como guias, como “Apocalípticos e Integrados” (1964), uma bíblia da cultura de massa. Mas foi como romancista que ele se tornou um dos autores mais lidos do mundo por seu livro “O Nome da Rosa”, que ganhou também uma versão cinematográfica.

Mais que um crítico acadêmico, Eco se tornou um crítico pop com uma obra que instiga a reflexão sobre os meios de comunicação. Foi com perplexidade que ele observou que, com o advento da internet - e sobretudo das redes sociais - “legiões de imbecis que antes falavam apenas num bar, e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade, passariam a ter o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel.”

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. | Foto: Marco Jacobsen

Exageros à parte e considerando a interface democrática deste tipo de participação coletiva na criação de conteúdos em massa, não deixa de ser interessante observar que Eco tinha razão ao criticar uma “rede de notícias” simultânea formada por qualquer um que queira inventar absurdos. Essa fábrica de mentiras desembocaria num risco para os crédulos de todas as tendências que embarcam diariamente nas fake news que, quanto mais combatidas, mais parecem proliferar.

Hoje, o que está em xeque é a credibilidade de um conteúdo feito por todos, incluindo os que reproduzem publicações sem nenhum senso crítico e sem nenhuma checagem. Eco não deixou barato quando vaticinou: “O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade.”

Na mesma medida em que a frase de Eco soa radical, não deixa de ser impressionante o volume de bobagens que chega diariamente ao conhecimento público, a gente fica pensando como pessoas com um suposto discernimento conseguem embarcar e reproduzir mentiras tocadas pela compulsão de postar sem pensar.

Nesse rol entram publicações absurdas quase sempre tocadas por um alto grau de ideologias que, como fermento, fazem os bobos crescerem na sua reprodução incessante de “verdades” compradas como uma garrafa de cachaça de má procedência nos botequins das redes.

Para ilustrar, selecionei algumas frases que passaram por minha linha do tempo esta semana e que, embora choquem pelo absurdo ou distorção da realidade, deixam muitas pessoas convictas de que o “dito” ou “escrito”, não importa por quem e com qual interesse, são a verdade. Neste rol, soam forte as vozes de muitas militâncias culturais, políticas ou religiosas.

- “Não teve extinção de dinossauros coisa nenhuma. Certeza que tem uma galera inteligente que só usa o cérebro reptiliano.”

- No dia do Juízo Final, todas as conversas de WhatsApp serão vistas numa tela grande e lidas em voz alta.”

- “Bolsonaro vai mostrar na ONU um diamante de 2,5 toneladas que o exército encontrou com uma Ong na Amazônia.” (Nota: o exército já desmentiu e o vídeo da pedra mostrada na internet, como sendo da Amazônia, é um cristal de rocha encontrado na Bahia)

- "Dar o dízimo em dólares aumenta suas chances de ir para o céu. Temos que ser inteligentes”

- “O aquecimento global se deve ao excesso de almas pecadoras queimando no inferno. Como a terra é plana e o inferno fica embaixo dela, sentimos o calor.”

Agora reflitam e respondam sinceramente: Umberto Eco tinha ou não tinha razão?