Um amigo diz que acordou “virado no Jiraya”. Entendo que o sujeito está de mau humor e percebo que muitos vezes também acordo “virada na Jiraya”, para usar a expressão no feminino. Procurei o seu significado e vi que se refere a uma série da televisão japonesa que no Brasil, nos anos 1980, recebeu o nome de “Jiraya – O Incrível Ninja.”

A série tem um personagem que destoa dos heróis de superpoderes, enveredando pela temática dos corajosos ninjas, que ainda não havia sido explorada. Mais do que me chamar a atenção pela série, a expressão “virada no Jiraya” me faz rir a cada vez que a ouço e intuitivamente sei que alguém está muito bravo, “soltando fogo pelas ventas”.

Existem muitas expressões sobre estados de espírito alterados que cabem bem no atual momento brasileiro, no qual todo mundo parece estar “virado no Jiraya.” E não é para menos. “Viro na Jiraya” a cada vez que leio bobagens ou mentiras sobre o meio ambiente, gente que discorda dos cientistas nas redes sociais onde todos parecem ser doutores ultimamente. Aí, vêm aqueles posts afirmado que o fenômeno que levou o céu a escurecer em São Paulo e ocasionou a chuva preta, no último dia 19, não teve nada a ver com as queimadas.

Os “especialistas” no tema, discordam dos pesquisadores do INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – e do Inmet – Instituto Nacional de Meteorologia - só para ficar em dois exemplos dos órgãos especializados que se cansaram de explicar que o fenômeno ocorreu pelo encontro da fumaça (ou pluma) das queimadas com uma frente fria. Mas os “sabidos” insistem que são os donos da verdade e engordam as fake news para alimentar seus mestres de coisa nenhuma.

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. | Foto: Marco Jacobsen

Fico “virada na Jaraya” a cada vez que vejo uma chuva de mentiras despejadas na internet. Mas também poderia ficar “virada no saci” e “rodar a baiana”, só para lembrar expressões populares. Buscando sinônimos para “virado no Jiraya”, também encontrei “virado no Guedé” e “virado no Djanho.” Todas variáveis de um estado de braveza ou impulsividade, mas que adquirem leveza quando ditas de forma tão engraçada.

Convivo na Folha com um diagramador que me faz rir todos os dias, mesmo quando estamos afundados no trabalho. É só alguma coisa dar errado para o Gilberto Soares – o Giba – disparar: “É o saci de bota.” E fico imaginando o curupira com uma bota só. Giba tem um compêndio de palavras e expressões hilárias, uma criatividade que o faz inventar muitas coisas, é um criador de neologismos.

Em tempos nos quais a discordância é parte da rotina, não custa também encontrar boas traduções para as fake news, que estão no DNA do atual momento brasileiro, e podem ser entendidas como “lorotas” ou “balelas”.

Mas para aliviar o estresse nesse período, vou enfileirar palavras que têm a ver com o momento nacional e são divertidas porque indicam, com graça, situações reais: brucutu (palavra derivada de história em quadrinhos que significa homem grosseiro, bruto); boçal (imbecil ou ignorante); xucro (animal que não foi domado).

Para arrematar em alto astral, “fazendo das tripas coração” (expressão popular que significa transformar as adversidades em forças), vou falar do “paranauê” (expressão de origem tupi para prestar reverência a grandes rios), despedindo-me com “ajayô” (palavra de origem africana que significa saudação a Oxalá ou “se Deus quiser”).

Boa semana!