Não, não se trata de um estudo modorrento sobre a práxis revolucionária das ideias de Marx. O diretor francês Michel Leclerc, na linha de frente de simpáticos e irônicos contadores de histórias envolvendo a sociedade da França, em sua maioria amáveis, assina roteiro e direção de “Luta de Classes”, comédia inteligente sobre a amálgama social na escola. E a melhor parte: sobre o dilema entre os valores coletivos e as ideias individuais. O filme está em exibição na cidade a partir de hoje, em uma única sala. Digamos que é uma recepção especial aos jovens estudantes, especialmente dos ensinos fundamental e médio. Não exatamente de escolas do mesmo nível (lá as públicas são públicas para todos os públicos, nativos ou imigrantes), mas sempre é possível checar e aprender algumas regrinhas de convivência sobre a igualdade de oportunidades. E sobre outras igualdades que promovem (ou não) a integração racial e social.

Filme é um retrato alarmante de uma escola de duas velocidades, a dos ricos e a dos pobres
Filme é um retrato alarmante de uma escola de duas velocidades, a dos ricos e a dos pobres | Foto: Reprodução

O casal Sofia Belkacem (Leila Bekhti) e Paul Clément (Édouard Baer) simboliza várias dessas diferenças - Sofia é de origem árabe e família muçulmana, Paul, de família cristã. Os dois entram no perfil esquerdista/progressista: não são casados legalmente, mantêm distância de qualquer religião e criam seus filhos com liberalidade. Paul é velho roqueiro de banda punk, contestador do capitalismo ao ponto de querer recusar vender seu apartamento, no centro de Paris, com lucro ao fim de dez anos para poder comprar sua casinha no subúrbio.

“Luta de Classes”, que também aborda outras questões, desenha um retrato alarmante de uma tendência crescente em direção a uma escola de duas velocidades, a dos ricos e a dos pobres. Mas o filme também trata de questões como comunidade, barreiras culturais difíceis de salvar, discursos angélicos longe da realidade, ansiedade absurda por segurança, secularismo ou bullying. Essa divertida caminhada pelos subúrbios, onde as idéias esquerdistas se contradizem, não reduz sua tolerância e otimismo, pois se torna uma análise social implacável.

Leclerc explora com humor os limites da convivência entre diferentes posições políticas e valores num microcosmo da sociedade francesa. O fato de que várias situações são vividas por crianças torna tudo mais leve - mas não compromete a seriedade da discussão que o filme procura levar adiante. A conversa do filme levada avante é mesmo universal.