É provável que determinada parcela do público, aquela relacionada com dramas carregados de tintas, com sentimentos à flor da pele temperados por cenas de alta voltagem de pirotecnia emocional, considere o nível de contenção de “Um Ato de Esperança” (em lançamento nesta quinta (6) na cidade) um problema. A adaptação cinematográfica pura e direta do romance “The Children Act”, uma peça literária de Ian McEwan bastante cerebral, que ele mesmo assina, e sozinho, deixa isso claro para o espectador minimamente aberto ao desfrute de uma ficção em que o significado e a profundidade do assunto não demandam estridências de comunicação. De novo o autor volta a seu tema mais característico: a intromissão de um estranho na vida do personagem principal da trama, provocando efeitos dramáticos.

Emma Thompson: atuação consistente no papel de uma juíza
Emma Thompson: atuação consistente no papel de uma juíza | Foto: Divulgação

A personagem, Fiona Maye (Emma Tompson), é a juíza titular de uma Vara de Família, congestionada pelo volume de trabalho e obrigada a tomar decisões difíceis pela transcendência que elas têm para os implicados. E precisamente por seu excesso de dedicação, seu casamento de muitos anos está por um fio. O filme dedica boa parte de sua metragem a esse desgaste com o marido (Stanley Tucci), mas também se debruça sobre o caso jurídico que está preocupando Fiona: um jovem paciente com leucemia está hospitalizado e os países recusam o tratamento por transfusões – os três são testemunhas de Jeová. A juíza deve sentenciar se, apesar desse impedimento religioso, o recurso deve ser proporcionado ao paciente. E o casamento acabou de fato.

Como tanto a legislação sobre o menor (o paciente tem 17 anos) como a jurisprudência inglesas estabelecem que a saúde deva prevalecer acima de qualquer outra consideração, não parece haver conflito de consciência, mas uma especial simpatia pelo rapaz internado. Com sobriedade expressiva às vezes tangendo o exasperante, tal o enxugamento dos sentimentos, o longa de Richard Eyre (um diretor que não esconde sua formação acadêmica) no entanto oferece generosa dose de satisfação aos que procuram um cinema mais reflexivo que emotivo, aquele que deixa de lado o arrebatamento – sem que isto signifique um trabalho frio ou desumano – e se concentra em camadas mais profundas da história.

Alguns pontos mais débeis da trama são fartamente compensados pela sobriedade e pelo brilho do trio de interpretes (Emma Thompson, absoluta em sua expressividade), consistentes na pele de personagens tão diferentes mas carregados com suas verdades. Há um desnecessário toque de humor colocado nos ombros do secretário da juíza.