Com a net, mais que nunca fatos são distorcidos ou situações são olhadas de um lado só, para servir a narrativas, forjando ou reforçando imensas ilusões coletivas. Mas quem ver bem tem de olhar de todos ao lados.

Por exemplo a narrativa da escravização milenar da mulher omite, entre outros, o fato de que elas, se quisessem rodar a saia, trabalhando fora de casa e assumindo protagonismo como hoje se apregoa, entretanto não teriam onde ou com quem deixar os filhos, simplesmente porque não houve creches nem escolas ou máquinas de lavar até há poucos séculos ou décadas. A narrativa da mulher mártir da Humanidade serve a uma visão vingativa da História, versão machista do feminismo.

Já a narrativa dos índios como exemplos de paz desconhece ou despreza que, antes da chegada dos europeus, as tribos viviam em guerras e rivalidades que os conquistadores bem souberam aproveitar. Por exemplo, em Geografia Física do Paraná, Reinhardt Maack conta que o explorador espanhol Cabeza de Vaca, para subir seus barcos bergantins pelo Rio Paraná até Foz do Iguaçu, contou com o apoio de muitas tribos, em troca de parceria guerreira contra vizinhos inimigos, tornando a viagem uma imensa mortandade ao longo do rio.

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. | Foto: Reprodução

As narrativas começam com distorções, como o Brasil ser um país negro porque negra seria 52% da população. Entretanto (arredondando os números) são só 8% de negros, mas que somados aos 44% de pardos formariam essa maioria. Entretanto (na realidade sempre há tantos entretantos...), esquece-se que metade dos 44% de pardos são também meio brancos, ou 22% da população. Usando a mesma má-temática e somando esses 22% aos 48% de brancos, estes seriam maioria de 70%... e a narrativa negrista revela-se na verdade racista.

Maack conta que uma bandeira de Borba Gato (com centenas de mamelucos, mestiços de brancos com índios...) preou 100 mil índios no Norte do Paraná, levando para São Paulo, pela floresta, em grupos de 10 amarrados pelo pescoço com cipós finos - e só 10 mil chegaram vivos. Entretanto, sem os bandeirantes que vinham aqui prear índios, a linha do Tratado de Tordesilhas talvez não fosse rompida e Londrina seria hoje parte de um país de língua espanhola com acesso ao mar apenas pelo vizinho Brasil.

Nos quilombos dos escravos fugidos havia, entretanto, escravidão, também entretanto coisa comum nas terras africanas de onde vieram nossos negros, ainda a parte mais carente da população. Já nossa minoria de origem japonesa, apenas 1% da população, chegou aqui só com malas e coragem, fugiu do engodo trabalhista das fazendas e se firmou como gente trabalhadora e desenvolvida. Seriam por isso melhores que os negros? Nem melhores nem piores, se lembrarmos que vieram de um império milenar, com muito mais organização social e política que na África, entretanto de onde todas as raças do mundo vieram.

Entre o tiroteio de opiniões e as enfumaçadas visões ideológicas, surgiu a brilhante sugestão de inserir QR-code nas estátuas, para se saber a vida do estatuado com todos os defeitos e virtudes. Em vez de derrubar estátuas, aprender com elas, que assim até se tornariam mais humanas.