Cadeira de balanço
PUBLICAÇÃO
sábado, 15 de outubro de 2022
Domingos Pellegrini
Visitante por favor
não sente nesta cadeira
nela minha mãe passou
suas tardes derradeiras
...
Pois gostava mais das tardes
achava as manhãs sem graça:
“A manhã é uma criança
cheia de atividade
já a tarde é mais tranquila
até a vila aquieta
e tem mais nuvem no céu
tem até mais borboleta”
...
É cadeira de balanço
mas ela mal balançava
o cão no meio dos pés
nas mãos a caneca dágua
...
Dizia de brincadeira
“balanço demais da conta
aqui na minha cadeira
chego até a ficar tonta”
...
Com voz de menina disse
“se a noite é a morte do dia
a tarde é a meia idade
a noitinha é a velhice”
...
E “a primeira estrelinha
é a que mais alumina
depois aparecem tantas
enjoo de tanta estrela
eu vou é pra minha cama
meu pijama de flanela”
...
E dava balançadinha
qual se a cadeira pensasse
e dizia “é de noitinha
que o diabo lança o laço”
...
Deitava logo e acordava
meio da noite - e então
procurava a cadeira
palmeando escuridão
...
Eram mais que companheiras
como a semente e o fruto
uma existia pra outra
a cadente a cadeira
...
“Só água é que mata sede”
um dia ela falou
“e só damos mais valor
naquilo que a gente perde”
...
“Não me chamem de idosa
prefiro velha porque
idosa é de dar dó
mas velhos todos vão ser”
...
E quando deitou na cama
para o sono derradeiro
falou vou sentir saudade
- Saudade de quem, mama?
- Saudade até da cadeira...
...
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