Quem acompanhou a mídia nos últimos dias tomou ciência da nuvem de gafanhotos que começou no Paraguai e agora flutua sobre a Argentina, ameaçando ingressar em solo uruguaio e brasileiro, dependendo da direção dos ventos e temperatura. A Argentina informa que a população da nuvem já foi reduzida em 80% com o uso de inseticidas pulverizados via aérea ou terrestre, mas que existe a ameaça de uma nova nuvem proveniente do norte do país.

Estes insetos se alimentam preferencialmente de gramíneas (pastagens, milho, arroz...), mas podem atacar qualquer vegetal que encontrem pelo caminho. É importante informar que sua alimentação é restrita a vegetais e por isso eles não são prejudiciais à saúde humana. Pelo contrário, podem até ser fonte de proteínas na alimentação de humanos. Povos asiáticos os consomem há séculos.

A imagem da nuvem desses insetos assusta. Entretanto, o problema é um velho conhecido e ocorre esporadicamente em diferentes regiões do planeta de forma cíclica e favorecida pelas condições climáticas e pela falta de inimigos naturais que iniba o seu crescimento populacional. Tem-se notícias deles desde os primórdios da civilização humana. Segundo a Bíblia, a praga dos gafanhotos teria sido uma das sete pragas do Egito, a qual dizimou suas plantações gerando milhares de mortes por fome e inanição. Não havia agrotóxicos nessa época e o jeito foi esperar a praga acabar - também por fome - depois de destruir toda a vegetação do Delta do Rio Nilo, onde se concentrava a produção de alimentos daquele povo.

Vale lembrar que o primeiro inseticida disponibilizado ao mercado brasileiro foi para controlar os surtos de gafanhotos. O nome técnico do inseticida era BHC, mais conhecido pelo apelido de pó de gafanhoto, hoje banido do mercado por causa da alta toxicidade. Atualmente, o mercado oferece outras alternativas menos tóxicas para complementar o controle, quando as estratégias naturais não forem suficientes. Entretanto, o uso de inseticidas para combater gafanhotos quando usado inapropriadamente pode até piorar o desequilíbrio ecológico.

Vale ressaltar que uso de inseticidas é uma importante ferramenta de manejo de pragas. O que está errado é o uso exclusivo do pesticida em detrimento do manejo integrado de pragas, que adota táticas integradas de manejo cultural, biológico e químico. Por isso é de suma importância o uso racional de inseticidas, dando-se preferência para os produtos menos tóxicos e mais seletivos, que preservam os inimigos naturais das pragas.

É verdade que a natureza dispõe de mecanismos naturais para controlar as pragas, mas, como ocorreu no Egito antigo, ela às vezes falha e permite a proliferação da praga de forma descontrolada, instância quando os inseticidas químicos podem se fazer necessários. Caso a nuvem de gafanhotos presente na Argentina adentre o solo brasileiro, uma força tarefa do MAPA, com dezenas de aviões agrícolas está pronta para pulverizar os insetos com inseticidas, se isso se fizer necessário.

Não sabemos o que ocorreu nos países vizinhos onde a nuvem de gafanhotos se originou e nem se foi culpa do homem ou do ambiente. Porque, por exemplo, os inimigos naturais do gafanhoto não evitaram sua proliferação descontrolada? Seria porque os agrotóxicos eliminaram os organismos benéficos, sem afetar os insetos-praga? O aquecimento global teria proporcionado temperaturas mais altas que beneficiaram a multiplicação do inseto? Teria o desmatamento reduzido a população dos pássaros e outros predadores que se alimentam dos insetos? O mais importante de tudo agora é continuarmos a trabalhar para fortalecer uma agricultura brasileira sustentável com a adoção do manejo integrado de pragas que é desenvolvido e tão difundido por nossas instituições de pesquisa como Embrapa entre outras.

Amélio Dall’Agnol e Adeney Freitas Bueno, pesquisadores da Embrapa Soja