Parece não ter fim o conflito que travam entre si os ecologistas mais radicais, defensores da preservação das florestas acima de tudo e os agricultores, que defendem o direito de explorar o território ocupado pelas matas para a produção agrícola.

O Brasil foi sorteado pela natureza com um território imenso e apto para produzir quase tudo o que pode ser cultivado no planeta, mas permaneceu “deitado em berço esplêndido” durante séculos. Apesar da baixa fertilidade da maior parte dos seus solos, isso não impediu que eles fossem transformados em terras altamente produtivas, graças à intervenção da pesquisa brasileira que gerou tecnologias adequadas para a realidade edafoclimática do País, o que permitiu o desenvolvimento com eficiência de cultivos, pastagens e florestas cultivadas em áreas tropicais.

O solo brasileiro totaliza 8,5 milhões de km², dotados de exuberância ambiental e sem a presença de desertos, vulcões ou terremotos, entre outras inconveniências naturais. A quase totalidade desse território é agricultável, mas somente 65 milhões de hectares (Mha) ou 7,6% da área total está cultivada (Embrapa), sugerindo que muitos milhões de hectares permanecem disponíveis para futuras explorações e produção de alimentos, fibras e biocombustíveis (ou não?)!

Mais de dois terços da terra brasileira são áreas de preservação. Segundo a Embrapa, a vegetação nativa ainda cobre 68% do território nacional e cerca de 20% da área preservada fica dentro das propriedades privadas. Portanto, é uma preservação isenta de custos para a sociedade, com os custos integralmente assumidos pelos donos das terras, que não têm permissão para desmatá-las.

Apesar da extensa área preservada, parece ser consenso perante a opinião pública mundial que a agropecuária brasileira destrói cada vez mais suas florestas para a produção de grãos e pasto. Muitos cidadãos brasileiros também compartilham dessa visão distorcida da realidade e imaginam que a degradação da floresta seja ação da agricultura. As lideranças mais informadas sabem que a floresta é vital para a agricultura, como reguladora do regime hídrico no Brasil, na Bolívia, no Paraguai e na Argentina, conforme já informado nesse blog em 2017. Não é justo que os titulares de terras cultivadas sustentavelmente, que geram imposto e renda sejam responsabilizados por ações de outros setores ilegais que atuam na Amazônia. A agricultura ainda tem muita terra a incorporar à produção, sem desmate algum. Exemplo disso são as áreas de pastagens, que podem ser integradas à produção de grãos, sem deixar de ser pastagens, por meio da integração lavoura, pecuária e floresta cultivada.

Para alcançar a produção atual de grãos (252 milhões de toneladas - Mt), com a produtividade de 1990 (1.706 kg/ha), o Brasil precisaria cultivar - não os atuais 65 Mha - mas 148 Mha. Diferença de 82 Mha, salvos do desmatamento pelo aumento da produtividade, graças ao uso de tecnologia e do empreendedorismo dos agricultores; não do cultivo de novas áreas desmatadas. Com tais avanços, o Brasil evoluiu de importador de alimentos nos anos 1970, para atual segundo maior exportador e com potencial de alimentar seis vezes a sua população.

Pareceria racional que a opinião pública nacional e internacional reconhecesse que a agricultura brasileira é um modelo de preservação ambiental. A área de matas preservadas do Brasil é mais do que o dobro da média mundial; maior do que a área preservada dos Estados Unidos e do Canadá, juntas. A exploração de parte do seu imenso território para a produção agrícola é necessária para que o Brasil possa promover o desenvolvimento socioeconômico da sua população.

O agronegócio é o setor mais dinâmico e eficiente da economia brasileira e sua exploração depende do cultivo de terras originalmente cobertas com mata nativa, mas o desmatamento para a agricultura data de muitos anos atrás. Mesmo que a preservação das pessoas seja prioridade ante o ambiente, sabe-se que a cobertura amazônica é importante para manter a pluviosidade nas regiões Centro-Oeste, sudeste e Sul do Brasil, onde se encontra a mais consolidada área de produção do País.

Não se pode criminalizar a abertura das áreas de produção já consolidadas, porque qualquer nação busca acima de tudo o bem-estar do seu povo, que para alcançá-lo poderá depender do desmatamento e do cultivo de áreas de mata nativa, desde que o faça de maneira sustentável, como se fez no passado. Hoje, a floresta amazônica já faz o seu papel, sugando vapor d’água do oceano para o continente e mantendo o rio aéreo que converge para a região subtropical, além de encerrar uma enorme reserva de biodiversidade e de recursos para o extrativismo e o turismo.

Nação coberta por florestas, mas com má fama ambiental não combina.

Amélio Dall’Agnol e Arnold Barbosa Oliveira, pesquisadores da Embrapa Soja

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