Imagem ilustrativa da imagem Vítimas pagavam até R$ 20 mil para compra de túmulos em Ibiporã
| Foto: Divulgação PMI

As vítimas já identificadas do esquema criminoso que comercializava ilicitamente direitos sobre terrenos no cemitério São Lucas, em Ibiporã (Região Metropolitana de Londrina), pagavam a partir de R$ 1 mil pelos espaços. Em um caso, uma mulher chegou a repassar para os investigados R$ 22 mil, para a aquisição de um jazigo destinado ao sepultamento do tio.

Inicialmente, a vítima transferiu R$ 10,6 mil para o filho do proprietário de uma funerária da cidade, que segundo o MP-PR (Ministério Público do Paraná), sabia do esquema. Foi o pai dele que ofereceu a venda do túmulo e iniciou a negociação. Após o primeiro repasse, a mulher ainda pagou mais quatro boletos. O montante seria a “quitação” para compra do terreno.

O MP-PR denunciou, na quinta-feira (5), 15 pessoas suspeitas de envolvimento na operação Necrópole, deflagrada em outubro do ano passado pelo Núcleo de Combate à Corrupção da Polícia Civil. A FOLHA teve acesso à denúncia. Entre os denunciados estão três servidores municipais de carreira. O ex-coordenador administrativo da Divisão de Cemitério é um dos funcionários públicos e foi apontado como o líder da organização criminosa. Os outros dois são coveiros.

Os demais indiciados são parentes do ex-coordenador, a colaborada de uma academia e funcionários de duas funerárias. “Servidores públicos com particulares se aproveitavam de uma nítida fragilidade da fiscalização do cemitério, agindo de forma ordenada, e encontram espaço propício para realizar um verdadeiro comércio de bens pertencentes ao município. As vendas ocorriam como se os túmulos pertencessem a eles (denunciados)”, apontou o promotor Bruno Vagaes.

O comércio de túmulos por particulares é vedado pela legislação municipal. As concessões de direito perpétuo só podem ser feitas pela prefeitura. Apenas com as 46 vendas ilícitas, a estimativa é de que o poder público teve um prejuízo de R$ 203 mil, entre 2012 e 2019. Os crimes elencados pelo MP foram organização criminosa, corrupção passiva, estelionato e subtração/ocultação de cadáver.

NOVO INQUÉRITO

A investigação ainda constatou que um túmulo era utilizado como desova. No dia da operação, policiais encontraram restos mortais de seis pessoas, que foram retirados com antecedência de sepulturas regulares para a comercialização. Duas ossadas estavam em sacos guardados na sala de administração do cemitério.

Um segundo inquérito está em andamento para verificar outras possíveis vendas ilícitas. “Não conseguimos mensurar o número exato de vendas que esses envolvidos realizaram em sete anos. Sem dúvida é um número muito elevado e a denúncia oferecida é apenas uma parcela no âmbito do que aconteceu no cemitério de Ibiporã”, destacou Vagaes.

ADMINISTRATIVO

De acordo com a Prefeitura de Ibiporã, no contexto administrativo foi aberto um processo disciplinar, que culminou na demissão dos três servidores investigados em junho. O procedimento constatou que o trio infringiu artigos da legislação municipal. O município recebeu mais de 500 protocolos de mutuários, entretanto, não houve situação de duas pessoas “brigando” pelo mesmo túmulo.

A prefeitura disse que vai aguardar o encerramento das investigações para que os acusados ressarçam os cofres públicos. “O antigo coordenador não seguia os protocolos. A pessoa quando precisa de um serviço no cemitério deve retirar uma solicitação de guia, vir na prefeitura, pegar a guia e fazer o pagamento. O ex-coordenador fazia tudo por lá e a prefeitura não arrecadava”, explicou Daniela Dourada, secretária municipal de Administração.

Há seis anos o cemitério São Lucas não conta mais com túmulos para vender. Quando uma pessoa não tem jazigo, o município faz a sessão de uso, é realizado o enterro e depois de três anos os restos mortais são colocados em um ossário. “Foram criadas (pelos servidores exonerados) sepulturas que não existiam entre um túmulo e outro, ao lado de árvores”, relatou.

Mais de um ano após a operação, o poder público ainda não conseguiu fazer todo o levantamento, já que os computadores com os arquivos e livros acabaram apreendidos pela polícia e não foram devolvidos.

Atualizada às 12h52