“Eu não só atravesso na faixa de pedestres, como fico de olho nos carros. Se eu faço minha parte, os motoristas também devem fazer, mas se atravesso fora dela e acontecer algo, eu perco um pouco da razão. Eu já tenho 67 anos e criei esse hábito há muitos anos. É uma questão de educação”, disse o porteiro Neo de Oliveira Lopes.

Imagem ilustrativa da imagem 'Velhos' hábitos no trânsito de Londrina colocam pedestres em risco
| Foto: Roberto Custódio

Ele passa semanalmente na rotatória da rua Senador Souza Naves com a rua Celso Garcia Cid, no centro da cidade. O local é um dos mais representativos para a CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização) quanto ao risco que os pedestres se colocam no trânsito.

“O trecho tem toda a sinalização, inclusive foi uma das primeiras rotatórias a receber a faixa de pedestre, em 2009. Mas os pedestres atravessam na esquina para não terem que andar pouco mais de um metro e seguir com segurança”, comentou o diretor de Trânsito da CMTU, major Sérgio Dalbem.

O fato da faixa de pedestres estar distante da rotatória, tem uma explicação. “O veículo, ao parar para entrar na rotatória precisa ter um espaço livre para não interromper os demais carros que estão circulando nela”, justifica. A mesma situação ocorre nos outros trechos elencados pela CMTU: entorno do Terminal Urbano Central, avenida Rio de Janeiro com rua Benjamin Constant e no viaduto da av. Leste-Oeste com Dez de Dezembro.

“Quem vai acessar ou sair do terminal, ao invés de seguir pela calçada e atravessar na faixa, prefere se arriscar e atravessar a pista na diagonal. Até mesmo a faixa elevada existente no local deveria ser melhor explorada pelos pedestres. Nessa mesma rua, seguindo adiante na esquina com a Rio de Janeiro, a mesma coisa. As pessoas se arriscam para não ter que andar um pouco mais. É uma questão de ter paciência também”, ressaltou.

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| Foto: Micaela Orikasa/Grupo Folha

A advogada Aline Fernanda Moreira comenta que na esquina das ruas Rio de Janeiro e Benjamin Constant, muitas pessoas tinham criado o hábito de atravessar na faixa que foi extinta. “A faixa foi pintada mais à frente e acabou ficando longe, mas as pessoas já tinham criado esse hábito. Passo sempre nesta rua, acho perigoso, mas também estava acostumada a atravessar por aqui”, justificou.

Na rua Professor João Cândido - um dos acessos ao Terminal Central - as pessoas se arriscam o tempo todo, inclusive idosos, com mobilidade e visão reduzida. “As pessoas adquirem um vício (de atravessar na diagonal) que é levado à rotina e em qualquer local, acabam atravessando dessa forma. Temos que estar sempre nos policiando”, avaliou Dalbem.

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| Foto: Micaela Orikasa/Grupo Folha

No recém inaugurado viaduto das avenidas Leste-Oeste e Dez de Dezembro, as faixas de pedestres também foram colocadas mais distantes do cruzamento da rotatória “para que os veículos parem sem atrapalhar o trânsito dos carros que estão fazendo a volta. O problema é que o pedestre não vai até a faixa e aí é que mora o perigo porque o veículo pode não ter tempo de parar”, reforçou o diretor de Trânsito.

Quem está na calçada do Terminal Rodoviário e precisa atravessar a av. Dez de Dezembro no início do viaduto (ou vice-versa), conta com uma faixa destacada em vermelho para passar com segurança, mas ao chegar no canteiro central é preciso caminhar cerca de cinco metros para chegar à outra faixa de pedestres e chegar no outro lado da pista. “Como neste lado não tem continuidade da faixa, as pessoas se arriscam atravessando no meio da rua e aqui é muito perigoso. Tem muito movimento e os carros vêm em alta velocidade”, observou Elena Torres, que trabalha em uma loja em frente ao viaduto.

Mudança de foco

O diretor de Trânsito da CMTU disse que são diversos os mecanismos disponíveis na ruas e avenidas para garantir a segurança dos pedestres. Ele cita a faixa de pedestres com ou sem semáforos, as placas verticais sinalizando a travessia, principalmente para os condutores, os semáforos com porta-foco que traz a figura do pedestre em verde e vermelho, as botoeiras e as placas de Olhe e Sinalize.

“O principal deles é a própria pessoa, sinalizando que quer atravessar a rua e fazer com segurança assim que todos os carros pararem. Mas é preciso que todos assumam isso, cobrando dos veículos porque os pedestres são o elemento mais frágil e importante do trânsito”, pontuou.

Dalbem acrescentou ainda que faltam campanhas maciças dirigidas aos pedestres, inclusive de grandes montadoras. “Estamos aí com praticamente 100 anos do automóvel no Brasil e desde então, toda campanha foi voltada para o consumo, luxo, status. é preciso mudar um pouco o foco. Em algumas cidades, só nos últimos 15 anos é que se começou a fazer campanha para o ser humano em relação aos direitos que ele tem como pedestre".

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| Foto: Micaela Orikasa/Grupo Folha

Números

No mês de julho, a FOLHA publicou um levantamento encomendado pelo Corpo de Bombeiros a respeito dos acidentes de trânsito em Londrina. Do dia 11 de março (início da pandemia) até o dia 29 de julho, a corporação registrou uma queda de 26% em comparação ao mesmo período de 2019. Foram 1.426 ocorrências no ano passado e 1.052 até a data incluída em 2020.

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| Foto: Roberto Custódio

As colisões entre automóveis representam mais da metade do total de registros deste ano, com 593 atendimentos, seguido de quedas de motos (297), choque contra anteparo, como postes ou árvores (68), atropelamentos (64), capotamentos (22), tombamentos (5), saídas de pista (2) e submersão de veículo (1).

Os números dos bombeiros são incluídos no Placar do Trânsito da CMTU, mas apesar da diminuição nas ocorrências, Dalbem chamou a atenção naquela ocasião sobre os números de atropelamentos. Conforme a última divulgação da companhia, que compreendeu o primeiro semestre deste ano, foram 108 pessoas atropeladas contra 140 no mesmo período de 2019. O número de mortes não teve uma redução. Foram 9 óbitos nos seis primeiros meses do ano passado e 10 em 2020.

"É um sinal de que os motoristas e motociclistas continuam imprudentes, mas o pedestre precisa colaborar. Para isso, temos a campanha Olhe e Sinalize, em que a pessoa, com um gesto simples, avisa ao condutor que quer atravessar. Nessa época de império dos celulares, é uma medida que pode evitar até uma morte", esclareceu. (Colaborou Rafael Machado)