Os cinco dias úteis consecutivos que a obra da trincheira da avenida Leste-Oeste ficou parada – de 12 a 19 de março – por conta de protesto dos funcionários fazem parte de um problema que virou rotina na construção. As intervenções tiveram início em janeiro de 2021, porém, os primeiros registros de manifestações são de abril de 2022. Desde então foram 28 dias de braços cruzados por paralisação dos operários, segundo levantamento feito pela FOLHA a partir de dados obtidos via Lei de Acesso à Informação.

Se contar os 23 meses com atos, a média é de um dia parado a cada 24 trabalhados ou um mês inteiro sem movimentação. Calculando que o prazo para conclusão é 30 de abril, a edificação poderia ficar pronta em março se a empresa não tivesse descumprindo regras trabalhistas e, como consequência, não houvesse nenhuma interrupção.

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Entre os motivos que fizeram os funcionários promoverem os protestos, de acordo com a Prefeitura de Londrina, estão a falta de pagamento de verbas rescisórias de trabalhadores da mesma empresa e algumas vezes de outras obras da empreiteira, ausência de depósito do FGTS, atraso no adiantamento, vale-alimentação e até salário.

“A única força que temos, sindicato e trabalhador, é cruzar os braços. É uma forma de chamar a atenção e tentar ‘tocar’ no coração do patrão, que ele tem que pagar os trabalhadores”, defendeu Luiz Alves de Oliveira, diretor do Sitrapav (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada no Estado do Paraná).

O sindicalista afirmou que os constantes descumprimentos de direitos pela construtora precarizam o trabalho dos funcionários. Atualmente são cerca de 70 em Londrina. “Eles fazem compromisso com o dinheiro, têm cartão para pagar, muitas vezes passam por necessidades. O dinheiro do FGTS, por exemplo, eles esperam receber quando acabar a obra, mas se não está sendo depositado, o receio é de ficarem sem nada quando a construção for concluída. Já ganham pouco, ficam debaixo do sol forte”, elencou. A situação envolvendo o fundo de garantia teria sido sanada nesta semana.

JUSTIFICATIVAS

O município informou que a TCE Engenharia, que tem sede em Curitiba, tem apresentado justificativas para as demandas denunciadas pelos operários. “Quanto aos protestos de trabalhadores que tiveram atraso em pagamento de suas rescisões a empresa alega que são funcionários de outras obras e eventualmente trabalhadores discordavam dos cálculos. Em relação a atrasos em pagamentos de vale-alimentação e participação de lucros, foram regularizados pela empresa, que alegou haver divergência no entendimento dos prazos entre ela e os trabalhadores”, apontou.

NOTIFICAÇÕES E PENALIDADES

A prefeitura garante que sempre que há uma paralisação a empreiteira é notificada. “As paralisações resultam em atraso da obra, que gera notificações e processos de penalidade administrativa, havendo um processo de penalidade administrativa em etapa final, podendo ser aberto novo processo. Cada paralisação representa prejuízo para a contratada, afinal, há pagamento das diárias de trabalho sem a execução de qualquer serviço”, elencou o poder público londrinense na resposta enviada à reportagem.

A empresa foi multada recentemente em R$ 915 mil e um dos motivos que levou à penalidade foi justamente os dias sem obras por manifestações dos trabalhadores. Na avaliação de Oliveira, o município poderia fazer mais. “A prefeitura também tem sua parcela de culpa, porque ela precisa fiscalizar. O fundo de garantia, por exemplo, o município deve conferir melhor, se realmente está em dia. Tem que estar cobrando a empresa”, advertiu. “Caso a empresa fique irregular com débitos trabalhistas o pagamento de medições fica suspenso e a prefeitura pode acionar o seguro da obra”, ponderou a prefeitura.

Quem mora na região e acompanha a evolução da trincheira de perto demonstra indignação com tantos percalços, que acabam impactando no prazo de entrega. “É um poeirão danado aqui, principalmente nas casas mais próximas. Ficamos receosos sobre o dia que prometeram entregar, mas tem que tentar ter esperança que vai dar certo”, comentou o aposentado Sérgio Borsato, que vive no jardim Shangri-Lá. A reportagem não conseguiu contato com os representantes da empresa.