Técnico de manutenção do HU fala sobre o enfrentamento da pandemia
Apesar da mudança na rotina, Paulo Rocha ressalta o orgulho de trabalhar ajudando pacientes a atravessar esse momento
PUBLICAÇÃO
segunda-feira, 11 de maio de 2020
Apesar da mudança na rotina, Paulo Rocha ressalta o orgulho de trabalhar ajudando pacientes a atravessar esse momento
Laís Taine - Grupo Folha
Nem só de enfermeiros e médicos se constrói um hospital. Paulo Rocha, 47, é técnico de manutenção e responsável pela divisão da manutenção do HU (Hospital Universitário), unidade de referência no tratamento de doentes por Covid-19 em Londrina. Ele faz parte da equipe que monta os leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e conta como a situação de pandemia intensifica a rotina e o orgulho de trabalhar ajudando pacientes a atravessar esse momento. Esse relato faz parte da série da FOLHA sobre profissionais da área da saúde que atuam no enfrentamento da pandemia da cidade.
Uma fechadura quebrada, um ar-condicionado com defeito, consertar equipamentos... O dia a dia de Rocha e sua equipe atravessa corredores e alas resolvendo problemas de manutenção do HU, trabalho que aumentou com a chegada do novo coronavírus. “O serviço dobrou por causa desse momento. Tem que preparar leitos de UTI, que não é só o respirador, tem que pensar nos pontos de gases medicinais, cama ideal, ar-condicionado, toda a estrutura que uma UTI exige”, menciona.
O INÍCIO
No início da pandemia, o trabalho da equipe se concentrou na estruturação para que o hospital aumentasse a capacidade de atendimento o mais rápido possível em um cenário de incertezas. Compras de materiais, cadastros de equipamentos, montagem, estrutura, novo fluxo de manutenção. “A gente pensa que é simples, mas no caso de um vírus, a troca de um filtro do ar-condicionado, por exemplo, é mais frequente, por isso a demanda aumenta, é um leito muito mais complexo”, aponta.
Fazer tudo em meio ao desconhecido e novas formas de agir foi o desafio. “É tenso, porque você anda no corredor e está sempre cheio de pessoas. Vai passar em uma porta, espera a pessoa passar, fica com mais receio de encostar nas coisas, como corrimão da escada, fica sempre inseguro com a mão e isso é importante, porque nos leva a lavá-la mais vezes”, comenta. Rocha já tinha experiência com o setor de MI (Moléstias Infecciosas), mas conta que o novo vírus causa receio maior entre ele e os colegas de trabalho.
EM CASA
Mas a mudança de rotina começa e termina em casa. Exposto ao vírus diariamente, Rocha é cuidadoso no contato com a família. Além de ter o álcool em gel como companheiro no trajeto, também providenciou um sistema próprio de segurança, já repetido por muitos. “Eu trago uma roupa e deixo aqui (no hospital). A roupa que eu uso aqui no hospital não é a mesma que eu levo para a casa. E chegando lá, eu fiz um espaço onde eu tiro toda a roupa, os pertences, carteira, óculos, e aquela roupa já vai para outro lugar no plástico e eu vou direto para o banheiro”, afirma.
Rocha é pai de dois jovens que compreendem e ajudam a conscientizar outras pessoas sobre a doença, além de corrigir informações falsas, o que se tornou recorrente no ambiente de trabalho do pai. As fake news que surgiram sobre o HU eram tão graves e tão alastrantes que Rocha se via passando o dia tentando acalmar familiares e amigos que se preocupavam. “Um tremendo desserviço”, comenta.
VALOR
Agora que passou o primeiro impacto que a doença causou, fortalece o quão necessário é o trabalho da sua equipe. “Muitas pessoas dependem da saúde pública e a gente pensa como uma coisa simples pode afetá-las. Estragou um aparelho, mas às vezes aquele aparelho vai desmarcar a consulta de uma pessoa que só vai conseguir remarcá-la para daqui 4 ou 5 meses. Deixar trocar uma lâmpada, pode deixar de fazer a cirurgia, temos essa consciência”, defende.
Valor de saber que faz parte de um sistema maior, com diversos profissionais, para quais perder um paciente ou um colega para a doença é devastador. “Acho que uma das coisas que motiva qualquer pessoa que trabalha na Saúde é a empatia”, comenta. Rocha perdeu um colega que prestava serviço ao hospital e lamenta que a família passe por isso.
“Nos entristece saber que foi um pai de família, dois filhos pequenos, mas isso também nos motiva a lutar contra isso e oferecer um serviço de qualidade, porque, infelizmente, vai acontecer com mais pessoas e, mesmo aquele que é acometido e acaba acontecendo o pior, que ele tenha um atendimento de qualidade, digno, que seja respeitado como ser humano. É triste, principalmente o desfecho, que não tem nem o ritual importante para a despedida dessa pessoa”, lamenta.
Fatores que levam à melancolia social, mas Rocha encontra a cura no valor do próprio trabalho. “Realmente é um momento bem triste, porque ninguém gostaria de viver isso, eu tenho 47 anos e eu nunca vivi isso, nunca pensei que iria andar no Centro da cidade e ver tudo fechado como eu vi, mas fazendo parte dessa equipe de coragem, me dá força para superar medo e insegurança, porque faço parte desse grupo de trabalho que pode amenizar tudo”, orgulha-se.