Diva Correia (na segunda fila, a segunda, da esquerda para a direita) e os voluntários do projeto
Diva Correia (na segunda fila, a segunda, da esquerda para a direita) e os voluntários do projeto | Foto: Marcos Zanutto



"‘O que você sonha?’ Eu perguntei. Eles não sabiam o que era isso", recorda Diva Euclides Correia, 73, fundadora do ProRev (Projeto Recrutando Vidas), que atende 73 crianças no jardim São Marcos (zona sul de Londrina). Movida por amor ao próximo e empatia, a dona de casa muda visão sobre o futuro de quem não sabia sonhar.

Há 11 anos, Correia resolveu visitar no bairro uma mulher grávida que estava doente. "Aqui não era pavimentado, não tinha organização, era um assentamento", descreve. Nas visitas, via que as crianças a seguiam e sentiu que poderia também fazer algo por elas. Em um cômodo, doava o seu tempo contando histórias e oferecendo bolachas.

"As condições eram ruins. Eu via que as crianças tinham problemas respiratórios, porque quando chovia era barro, mas quando era seca tinha muita poeira. Então buscamos o processo de pavimentar o bairro", informa. Com trabalho de formiga, um passo de cada vez, foi melhorando a realidade daquela população.

Correia se viu chegando aos poucos e, quando notou, já estava montando algo. "Nós decidimos colocar o nome: projeto Recrutando Vidas. Aí eu não fui atrás das coisas, as coisas é que vieram", conta. Um professor de violão, outro de reforço escolar, outro de teclado. Hoje, o projeto oferece aulas de jiu-jitsu, música (violão, teclado, guitarra e baixo), inglês e oficina de cidadania e educação cristã.

A professora de língua inglesa, Aline Gasperi, 26, foi desafiada pela fundadora e está há dois anos ensinando inglês voluntariamente. "É um desenvolvimento de pessoas, não só cognitivo, de informação e educação. O projeto acaba desenvolvendo pessoas e impactando outras da comunidade. A dona Diva acaba inspirando a plantar a sementinha", avalia.

Concordando com o pensamento da professora, Amanda dos Santos, 14, revela que a contribuição vai além da educação, e fala em mudanças pessoais após frequentar o projeto. "Eu era triste. Um dia a dona Diva falou que eu não parava mais de rir, era verdade. Depois do projeto eu fiquei mais feliz, deu sentido a minha vida", afirma.

Como uma mãe que não gosta que façam distinção dos filhos, durante a visita da FOLHA, Correia apontava quem poderia falar e questionava: "vocês falaram com fulano, né?", preocupando-se de que todos teriam atenção. O grupo a trata como alguém da família: tia, avó, mãe, amiga, alguém que inspira e é exemplo.
Nesse clima familiar, o projeto venceu o 3º Prêmio Londrina de Cidadania, promovido pelo OGPL (Observatório de Gestão Pública de Londrina), como forma de incentivo e reconhecimento das boas práticas no município. "O prêmio vai servir para continuarmos nossa construção ao lado", reforça Correia. O valor recebido foi de R$ 5 mil.

O projeto conta com a ajuda de parceiros e promoções. A casa em que o projeto funciona é alugada, mas ao lado há uma construção de três andares, onde Correia planeja atender melhor as 73 crianças.

Aos 73 anos, a fundadora tem fôlego para planejar o futuro. Mais que isso, sonha. E sonhando, ensinou. "As primeiras aulas eram sobre sonho, que eles podiam imaginar, sem limitações. Depois de um tempo conversando eu tive a resposta. Eu descobri um sonho mais lindo que o outro."

FINALISTAS
O resultado do 3° Prêmio Londrina de Cidadania foi divulgado no mês de novembro. O Recrutando Vidas foi o grande vencedor entre os dez finalistas. Vista Bela Biblioteca Solidária e Clube das Mães Unidas ganharam o segundo e terceiro lugar, respectivamente. Outros finalistas são ADA (Associação Defensora dos Animais), Projeto Dançando um Sonho, Cursinho Fenix, Vocal Tok de Amor, SOS Vida Animal, Morada de Deus – Centro de Assistência e Recuperação de vidas e Associação Espaço Thalita Cumi.

SERVIÇO
Interessados em conhecer o Projeto Recrutando Vidas podem acessar a página do Facebook: www.facebook.com/aprorev .

Jovens dão continuidade ao projeto



Há 11 anos acreditando que as crianças podem ser o que quiser, o ProRev (Projeto Recrutando Vidas) vê o trabalho formando jovens que se valorizam, se sentem capazes e que compreendem a importância de promover a cidadania. "O primeiro resultado que a gente vê é a autoestima. Eles eram discriminados. Eu vejo potencial, que eles podem chegar longe", salienta Diva Euclides Correia, 73, fundadora do projeto que é desenvolvido no jardim São Marcos (zona sul de Londrina). Para ela, saber que alguns jovens atendidos hoje estão na faculdade é motivo de orgulho.

É o caso da Giovana Correia, 20, que está no 4º ano do curso de Jornalismo, na Unopar. "Eu comecei a vir aqui quando tinha 10 anos porque meus pais ajudavam, eu fui me envolvendo. Hoje dou aula de teclado e aprendo muito mais", defende.

A estudante conta que se interessou pelo curso após o OGPL (Observatório de Gestão Pública de Londrina) trabalhar cidadania em uma oficina para mini jornalistas no projeto. "Quando fiz esse curso, prestei vestibular e passei. Através do projeto eu me descobri", orgulha-se.

Ainda adolescente, Renan Ferreira, 15, entende a importância do trabalho social feito no bairro. "É importante para mim e para ajudar várias pessoas", explica o estudante que já participou de aulas de violão, baixo, bateria, inglês e jiu-jitsu, modalidade em que já conquistou nove medalhas.

Era a mãe de Ferreira quem recebia as visitas de Correia quando ainda estava grávida, por isso o adolescente cresceu no projeto e se diverte lembrando das mudanças que viu passar. "Eu lembro que só tinha uns banquinhos e tinha pouca criança", ri, nostálgico.

Júlio César de Souza, 29, começou frequentando grupos na igreja e foi convidado para dar aulas de educação cristã e cidadã. "Através das aulas fui tendo responsabilidade maior. Minha esposa veio trabalhar também e agregamos muita sabedoria. O projeto restaurou a minha família", sensibiliza-se.

Com a experiência, Souza pretende continuar o projeto onde ele mora, no jardim Novo Perobal (zona sul). "Tenho o sonho de levar a extensão do projeto para lá. E quero colocar em prática já no ano que vem", defende. Com apoio da fundadora, a associação pode ganhar nova sede e se expandir.

Todo fim de ano, o ProRev promove uma festa de Natal antecipada para celebrar com toda a família. "Aqui eu vi que é um lugar muito carente e acho que esse momento é importante para termos contato com a família", explica Correia.

Para o futuro, o ProRev pretende terminar a construção da sede para não ter que emprestar espaços e ter a estrutura adequada, com salas, banheiros e cozinha. Para isso, pretendem se cadastrar no Conselho Municipal da Criança e do Adolescente para conseguir arrecadar mais recursos para a obra. Enquanto isso, vão organizando promoções e dependendo de parcerias. (L.T.)