Considerando que a pandemia do coronavírus implicou em mudanças comportamentais para a maioria da população, pesquisadores na área de Psicologia aplicaram perguntas e testes a mais de mil pessoas para entender como elas estão lidando com essa nova situação. Os resultados revelaram diferenças significativas no nível de engajamento com as medidas de prevenção entre dois grupos: de empatia (pessoas que se preocupam mais com o bem-estar dos outros e tendem a extrair mais prazer da convivência social) e antissocial (pessoas cujas interações sociais são mais voltadas para benefício próprio em vez do bem-estar comum, e tendem a ter uma vivência social negativa).

Imagem ilustrativa da imagem Prevenção ao coronavírus:  você tem empatia ou é antissocial?
| Foto: Nelson Almeida - AFP

A coleta de dados ocorreu de março, no início da pandemia, até junho. “O grupo empatia respondeu o questionário mostrando maior preocupação em usar máscara, higienizar sempre as mãos, adotar isolamento social para evitar contágio, tanto contrair a doença quanto transmitir para outras pessoas. Já o grupo antissocial mostrou menor preocupação com essas medidas, minimizando sua importância, ou minimizando a doença”, afirma o professor Fabiano Koich Miguel, do Departamento de Psicologia e Psicanálise da UEL (Universidade Estadual de Londrina).

Outro achado do estudo é sobre o nível de engajamento nas medidas de contenção entre todos os respondentes. “Tanto do grupo empatia quanto do grupo antissocial tendeu a se manter relativamente estável. Ou seja, as pessoas tenderam a mudar pouco seus hábitos. Dito de outra maneira, as pessoas não começaram a se engajar mais nem menos na quarentena e nas medidas de contenção, ao longo do tempo”, observa.

Miguel conduziu as avaliações junto com o professor Lucas de Francisco Carvalho, da USF (Universidade São Francisco), de Campinas (SP), da mestranda Gisele Magarotto Machado e da pesquisadora e psicóloga Giselle Pianowski.

SENSO DE COMUNIDADE

“Os principais resultados mostram que há diferenças quanto ao nível de engajamento nas medidas de contenção, e essas diferenças dizem respeito a quanto as pessoas sentem a necessidade de buscar o bem comum, mesmo que para isso precisem momentaneamente abrir mão de necessidades próprias. Acreditamos que poderia haver maior investimento, por meio de políticas públicas, no senso de comunidade e no senso de união dos brasileiros”, argumenta.

Sobre as causas para a formação de personalidade, Miguel explica que há tanto influências genéticas como culturais e de experiências individuais. “Seria difícil apontar uma causa única que valesse para todo mundo, mas há experiências que são mais comuns a esses quadros. Por exemplo, pessoas com mais empatia tendem a ter uma vivência social mais prazerosa, recompensadora, preocupando-se mais com o bem-estar dos outros. Já na personalidade antissocial tende a ter uma vivência social negativa, com interações mais voltadas para benefício próprio em vez do bem-estar comum”, reflete.

QUESTIONÁRIOS

No estudo, os testes psicológicos que foram aplicados são utilizados internacionalmente em pesquisas com essas características psicológicas e já foram adaptados e estudados também no Brasil. O grupo trabalhou com o questionário PID-5 para avaliar a personalidade antissocial, como por exemplo, a frequência de comportamentos antagonistas e sensação de estar desconectado de outras pessoas, e o ACME para avaliar empatia, ou seja, a capacidade de se colocar no lugar de outras pessoas, entender motivos e sentimentos.

De acordo com o professor, um terceiro questionário foi elaborado pelo grupo com foco na experiência do entrevistado com a pandemia. Os resultados do estudo foram publicados na revista internacional “Personality and Individual Differences”.

A partir desses achados, os pesquisadores continuarão com a coleta de dados, incluindo outros testes, “para estudar a relação entre aspectos psicológicos, as exigências da pandemia, e a saúde mental ao longo do tempo”, comenta Miguel.

'APOSTANDO NO QUE VAI DAR'

No HU (Hospital Universitário), em Londrina, referência para o atendimento de pacientes com Covid-19 em toda a 17ª Regional de Saúde, a enfermeira da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, Renata Belei, tem percebido uma maior resistência de profissionais e população em geral de manter o comportamento de segurança, comparado ao início da pandemia.

“Lembro que no começo da pandemia havia um pânico e até brigas por máscaras entre os profissionais de saúde, mas as pessoas já sofreram muito, estão vivendo um grande estresse e muitas estão agora negando o risco. Na minha opinião, existe empatia, mas parece que muita gente está apostando para ver no que vai dar. Vejo que até os profissionais já não têm hoje o mesmo rigor de antes”, diz.

Preocupados com esse comportamento, uma nova campanha interna está alertando os profissionais do HU com o lema “A pandemia não acabou”. Também estão programadas capacitações em Biossegurança. “Mudou muito o olhar das pessoas frente ao risco e à consequência da contaminação”, justifica. ((Com Agência UEL)