Ao andar pelas ruas de Londrina é possível encontrar rampas de acesso, piso tátil em algumas calçadas e vagas prioritárias em estabelecimentos.. No Brasil existem leis como a LBI (Lei Brasileira de Inclusão), em vigor desde 3 de janeiro de 2016, que instituiu uma série de direitos às pessoas com deficiência; a alteração da Lei nº. 8.429/92, com o objetivo de garantir a efetividade das medidas de acessibilidade por parte da administração pública. O setor de construções deve seguir a NBR 9050, que teve sua última atualização em 2020. Conhecida como norma da acessibilidade, a regulamentação estabelece padrões para a construção, instalação e adaptação de espaços.

“Ainda assim, as cidades de uma maneira geral não se adequam de forma efetiva, assim como as edificações públicas. Essa situação deixa clara a falta de cultura da inclusão”, destaca a arquiteta Ângela Soares, que faz parte da equipe da Diretoria de Planejamento do Território e Edificações da Universidade Estadual de Londrina e já atuou como colaboradora no Núcleo de Acessibilidade da UEL. Para ela, com regulamentações como a LBI e a NBR 9050 não existem mais desculpas para que as cidades não se adequem a todas as pessoas.

Alef Campos Garcia, professor: "Eu não utilizo piso tátil porque às vezes fico mais perdido: dá em muro, dá em árvore, é muito próximo de portão"
Alef Campos Garcia, professor: "Eu não utilizo piso tátil porque às vezes fico mais perdido: dá em muro, dá em árvore, é muito próximo de portão" | Foto: Roberto Custódio

As leis e regras existem. Mas a acessibilidade no dia a dia das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida nem sempre é assegurada. Entre os problemas, calçadas sem manutenção e piso tátil instalado de maneira equivocada. "Eu, particularmente, não me utilizo de piso tátil porque às vezes fico mais perdido: dá em muro, dá em árvore, é muito próximo de portão e corremos o risco de ser mordido por cachorro”, relata o professor Alef Campos Garcia, 27, que tem a ajuda de um cão guia. Para ele, muitas vezes o piso tátil é instalado por ser uma exigência legal, mas está irregular, o que acaba atrapalhando mais do que ajudando.

Além disso, outros problemas urbanos comprometem a acessibilidade das pessoas com deficiência, como comenta Garcia. “Poda das árvores que não são feitas regularmente e os galhos acabam machucando o nosso rosto, lixeiras que às vezes excedem a capacidade e os lixos acabam ficando no chão...São N situações, é complicado.”

Ele teve a retina queimada ainda recém-nascido, quando estava na incubadora do hospital e até os 18 anos tinha visão parcial do olho direito e conseguia se locomover sem o auxílio de uma bengala ou cão guia. No entanto, por causa de um acidente, teve hemorragia no olho, fazendo com que perdesse o restante da visão. Por já ter nascido com pouca visão, Garcia já havia aprendido braile e mobilidade, e que ajudou a se adaptar à nova rotina com o uso da bengala.

Em uma das diversas situações em que se locomover se torna um desafio, o professor lembra que quando ainda não tinha o auxílio do cão guia caiu em cima de uma pilha de tijolos. Ele se machucou e acabou perdendo a bengala. “Quando eu saí de casa não tinha nada, quando eu voltei tinha uma pilha de tijolos na calçada do vizinho, e eu só fui perceber isso quando eu caí e quebrei uns 12 tijolos. A sorte que eu estava de calça, mas mesmo assim cortei um pouco a perna e perdi minha bengala. Na época eu morava na minha mãe e sempre criei passarinhos, aí fui seguindo o som de onde eles estavam e consegui chegar em casa e pedir ajuda para alguém buscar minha bengala. Quando eu voltei os tijolos não estavam mais lá, ou seja, alguém viu, mas ninguém me ajudou”, conta.

'NÃO É NADA BOM'

Para Clayson Marques Monteiro, 40, que há cinco anos sofreu um acidente e é cadeirante, se locomover no espaço urbano também está longe de ser acessível. “Não é nada bom, têm calçadas irregulares, falta de rampa de acesso e, além disso, faltam vagas prioritárias e acessibilidade nos banheiros”, comenta.

Monteiro faz parte do Instituto londrinense Pernas Preciosas, idealizado por Angelita Bonifácio, em 2018. Para ela, a acessibilidade começa na atitude das pessoas. “Em primeiro lugar, a própria população precisa ter mais empatia pelas pessoas com deficiência. Não estacionar em vagas prioritárias, por exemplo, por aí começa a acessibilidade, com a consciência de cada um”, explica. O instituto atende 106 paratletas em oito modalidades, oferecendo suporte e apoio para que pessoas possam se descobrir e romper limites.

Márcio Rafael da Silva, diretor do Instituto Roberto Miranda: " A tal da empatia é uma palavra muito importante nos nossos dias”
Márcio Rafael da Silva, diretor do Instituto Roberto Miranda: " A tal da empatia é uma palavra muito importante nos nossos dias” | Foto: Gustavo Carneiro - Grupo Folha

MUDANÇA CULTURAL

Márcio Rafael da Silva é diretor do Instituto Roberto Miranda, instituição onde Alef Garcia também é professor. Para ele, a imposição de leis não garante a acessibilidade sem que haja também uma mudança no comportamento das pessoas. “Há ainda bastante desinformação no Brasil e no mundo. Ninguém faz piso tátil para ajudar, mas por ser uma lei”, destaca o diretor.

Um outro problema apontado é que nem sempre as pessoas estão informadas sobre a lei ou para que serve o piso tátil, por exemplo. “É preciso mostrar as pessoas com deficiência para a sociedade e fazer com que as pessoas entendam. A tal da empatia é uma palavra muito importante nos nossos dias”, completa Silva.

A reportagem procurou a assessoria de imprensa da Prefeitura de Londrina para saber o que o poder público faz para melhorar a acessibilidade na cidade, mas não obteve resposta até o fechamento da edição.

TRÂNSITO

O Instituto Roberto Miranda existe há mais de 50 anos, atendendo cerca de 180 alunos na parte pedagógica e 130 pacientes na parte clínica. Os assistidos da instituição buscam uma reeducação visual para terem mais autonomia e poderem interagir com o meio. Está localizado na rua Netuno, no Jardim do Sol (zona oeste), onde o trânsito é bastante movimentado e perigoso.

Em 2017, a direção solicitou à CMTU ( Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização de Londrina) a instalação de uma faixa elevada para travessia de pedestres em frente ao instituto. Por questões técnicas, não foi possível instalar a faixa, mas a assessoria da CMTU informou que uma equipe foi ao local fazer uma nova verificação recentemente. Segundo a assessoria, um estudo está em andamento para a instalação de um redutor de velocidade e uma faixa de pedestre.

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