Os agricultores Miguel Felipe da Silva, 94, e Francisca Maria de Carvalho da Silva, 91, completaram no dia 25 de agosto 75 anos de casados. Os dois residem em Iguaraçu (Noroeste), cidade com 4.404 habitantes e apenas quatro nonagenários. Eles nasceram em Colônia Mineira, pouco antes de a localidade mudar de nome e ser conhecida como município de Siqueira Campos (Norte Pioneiro). Ela é de 1929 e ele é de 1926.

Francista Maria de Carvalho da Silva e Miguel Felipe da Silva:  casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos
Francista Maria de Carvalho da Silva e Miguel Felipe da Silva: casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos | Foto: Carlos Husek Fotografia

Apesar da idade, eles têm boa saúde, segundo a filha Terezinha Aparecida da Silva, 66, professora aposentada. Miguel deixou de andar de bicicleta recentemente, por conta da perda de audição. “A visão dele continua boa, mas se continuasse andando de bicicleta a perda de audição poderia fazer com que fosse atropelado”, relata. A reportagem conversou com Teresinha por telefone, que contou a história do casal e a rotina em Iguaraçu. Eles não puderam dar entrevista porque têm problemas de audição.

“Os dois estão lúcidos. Ele sabe toda a missa em latim. Eles têm acompanhamento de uma médica geriatra e ela acha uma coisa extraordinária o vigor deles”, destaca Terezinha, que diz que atualmente passam o tempo assistindo programas religiosos pela TV. A professora aposentada conta que um respeita a individualidade do outro, mas também conversam muito e cuidam um do outro. “Ele cuida dela, ela cuida dele. Ela reclama de alguma coisa e ele já chama a gente para ver se está bem”, detalha. O casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos.

Completar uma união tão duradoura é um feito e tanto no Brasil. Segundo as Estatísticas do Registro Civil do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2018, o tempo médio entre a data do casamento e a escritura do divórcio era de 14 anos. Ou seja, a união deles dura 535,71% a mais que a média dos casais brasileiros.

Casamento, em 25 de agosto de 1945, aconteceu no Norte Pioneiro
Casamento, em 25 de agosto de 1945, aconteceu no Norte Pioneiro | Foto: Acervo pessoal

NA ROÇA

Eles cresceram em Siqueira Campos e sempre trabalharam na roça. “Eles se conheceram lá em Siqueira Campos mesmo. E contavam que naquela época não podiam namorar sozinhos. O rapaz ia na casa dos pais da namorada e todos ficavam juntos”, relata a filha do casal, Terezinha Aparecida da Silva, 66, professora aposentada.

Foi na terra natal que o casamento aconteceu, mas o mundo vivia um momento conturbado em meio à Segunda Guerra Mundial. Naquele 25 de agosto de 1945 as notícias que chegavam até eles ainda eram das explosões das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, que aconteceram nos dias 6 e 9. “Essa é a lembrança mais forte que eles têm daquele dia”, destacou Terezinha.

A cultura do café chegou ao Paraná no início do século 20, mas o crescimento foi lento até 1945. Isso em conseqüência das duas guerras mundiais e também da quebra da bolsa de Nova York, em 1929, quando, em função dos grandes estoques, a forte crise econômica mundial e os baixos preços do produto, milhões de sacas tiveram que ser queimadas. Outro fator que dizimou os cafezais foi a geada de 1942, que atingiu quase a totalidade dos cafeeiros do Paraná.

A capitulação do Japão em 2 de setembro de 1945, poucos dias depois do enlace do casal, trouxe a esperança de melhoria da situação do País. O casal se mudou para Primeiro de Maio (Região Metropolitana de Londrina) para trabalhar na colheita de café. “Foi o sítio em que nasci. Lembro bem de lá. Quando não tinha colheita, eles ficavam capinando o terreno”, destacou a professora. “Não tinha televisor e não tinha luz elétrica. Eles tinham um rádio de pilha. Levavam uma vida bem difícil”, destacou.

Naquele tempo não havia muitas escolas na zona rural do Paraná. “Meu pai frequentou até segunda série e mesmo assim se desenvolveu tanto no aprendizado que chegou a dar aulas no sítio para o Mobral adulto, já que meu tio, que é irmão dele, era o responsável pela instrução de adultos naquela escola. Minha mãe é analfabeta e só sabe assinar o nome, mas ninguém passa ela para trás nas contas”, garantiu a filha do casal. O Movimento Brasileiro de Alfabetização era um serviço do governo federal da época.

Alguns anos depois, em 1964, o casal se mudou para Iguaraçu, onde permanecem até hoje. “A qualidade que admiro neles é a honestidade. Não gostam de ficar devendo sequer 20 centavos. Eu me espelho muito neles", elogiou, explicando que o casal é aposentado e dividem as contas do dia a dia. "Eles dividem tudo: conta de telefone, de água, de luz, plano de saúde. Um paga uma coisa e outro paga a outra. Sempre foi assim. O dinheiro dela é dela e o dele é dele, São corretíssimos”, acrescentou.