O jantar especial foi realizado no início da noite de segunda-feira, na Concha Acústica
O jantar especial foi realizado no início da noite de segunda-feira, na Concha Acústica | Foto: Fotos: Anderson Coelho



Aos poucos, os bancos vazios da Concha Acústica, no centro de Londrina, receberam centenas de moradores de rua. No palco, a atração cultural deu lugar a uma mesa farta. O jantar especial oferecido no início da noite desta segunda-feira (18) foi um alívio para quem não sabia ao certo quando teria acesso à próxima refeição. O cardápio (estrogonofe de carne e de frango) fez a alegria de quem coleciona histórias de dor e sofrimento.

S.A. foi um dos primeiros a se aproximar do local da festa. O londrinense de 51 anos vive nas ruas há 7, quando deixou a cidade para trabalhar em um supermercado de São Paulo. Problemas familiares e amigos o levaram até a cracolândia. "Fiquei três anos naquele inferno", contou ele, mostrando as cicatrizes no rosto, resultados de dívidas e discussões. A muito custo, retornou a Londrina, buscou tratamento, mas não deixou o vício. "Tenho contato com a família, mas com essa vida fica difícil. Essa vai ser a minha única refeição hoje", comentou pouco antes do jantar.

Os voluntários do chamado "Sopão Solidário" servem refeições todas as segundas-feiras, a partir das 18 horas, na Concha Acústica. O idealizador do projeto, Gervásio Gonzalez, calcula que mais de 60 mil refeições tenham sido oferecidas durante os 15 anos do projeto. A iniciativa surgiu depois que Gonzalez, morador da região central na época, percebeu que algumas pessoas aguardavam o final da feira para recolher produtos que estavam no chão e em caçambas. Da grande quantidade de beneficiados ao longo desses anos, um permanece vivo na memória de Gonzalez.

Aparecida Carvalho da Silva e a filha Bruna Stefany da Silva, voluntárias: Natal ganhou um novo significado
Aparecida Carvalho da Silva e a filha Bruna Stefany da Silva, voluntárias: Natal ganhou um novo significado



"A gente serve as refeições mesmo com chuva. Um dia, por causa do mau tempo, pouca gente veio e saímos com o que sobrou para distribuir para quem a gente encontrasse na rua. Um dos homens não tinha forças nem para engolir um leite com café. Só depois de um tempo, ele se recuperou e conseguiu comer a refeição mais sólida", relembrou.

Quem ajuda no preparo dos alimentos na cozinha cedida pela Igreja Metodista Central também se emociona por fazer parte do projeto. Pela primeira vez, a dona de casa Aparecida Carvalho da Silva, 43, e a filha Bruna Stefany da Silva, 21, colaboraram com a equipe de voluntários. Para as duas, o Natal ganhou um novo significado. "Já na cozinha, desde a hora que eu estava preparando a comida, eu estava pensando neles, em como eles são carentes e sozinhos e em como o pouquinho que a gente faz pode abençoar a vida deles", disse a mãe. "A gente tem também um parente morador de rua que não é daqui. Ele está em São Paulo e a gente não tem como ajudar. Ele mora na rua e não quer ser encontrado. Faz uns 9 anos que não temos notícia dele", contou a filha.

"Segunda-feira que vem estaremos aqui de novo", garantiu Gonzalez. Quem quiser colaborar pode ajudar no preparo dos alimentos todas as segundas-feiras, a partir das 13 horas, na Igreja Metodista Central. Doações em dinheiro ou de alimentos também podem ser feitas à equipe.