Mãe relata desrespeito com filho autista
Londrinense que tem filho com TEA diz que ainda é difícil mostrar para as pessoas que autismo é uma questão genética e não de falta de educação
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terça-feira, 17 de novembro de 2020
Londrinense que tem filho com TEA diz que ainda é difícil mostrar para as pessoas que autismo é uma questão genética e não de falta de educação
Laís Taine - Grupo Folha
“Eu tive que descer do ônibus para eles seguirem viagem, isso me trouxe muito constrangimento”, recorda Luciene Mariano, 45, mãe de Matheus, 12. O relato é sobre uma viagem de retorno de Santo André (São Paulo), em que o menino, aos seis anos e com diagnóstico de autismo confirmado, precisava de tempo para compreender que estava em um ônibus para seguir até Londrina.
“Ele começou a chutar o banco da frente, a moça que estava sentada se irritou, virou e deu de dedo na cara dele, o chamando de moleque, para parar de chutar. Eu tentei explicar que ele não ia entender, mas ela não me ouviu, começou a ofender. Eu não quis me exaltar para segurar o Matheus”, recorda.
A solução que a mãe encontrou naquela ocasião foi descer no meio do caminho, quando o motorista fez a parada na cidade de Ourinhos, interior de São Paulo. “Isso me marcou, se eu pudesse tirar esse dia da minha vida, eu tiraria. Fui para a delegacia, não tive resultado, porque a própria polícia não trata o caso como um crime”, conta. A mãe recorda que algumas pessoas saíram em defesa do filho e que boa parte questionou o comportamento da passageira, mas se preocupou em seguir viagem.
Para ela, esse foi o caso mais emblemático da falta de paciência e empatia, mas conta que, infelizmente, faz parte da rotina das famílias de autistas passar por situações constrangedoras. “Já deixei de ir em muitos lugares, no transporte coletivo, supermercado... Quando o Matheus grita ou tem algum comportamento, ele vira uma atração, todo mundo para pra olhar, mas não é sem querer, é um olhar de julgamento: ‘por que essa mãe não dá educação?’, é bastante constrangedor”, argumenta.
Matheus é o segundo filho de Luciene e o marido, Márcio Silva, 45, e conta que quando ele era menor, as pessoas não conseguiam identificar a necessidade de atenção especial do filho e mesmo quando explicado faltava compreensão. “Tem lugares que pedem para a gente agir de um jeito que eu não consigo, porque ele não entende regras. Mesmo que eu explique, querem que eu tente segurar essa parte do Matheus, dão sugestões de como fazer”, aponta.
Quando as pessoas dão abertura, a mãe tenta explicar o que é o autismo, mas “quando eu vejo que a pessoa tem mais interesse em me ensinar do que aprender, eu desisto”, revela. Para ela, ainda é difícil mostrar para as pessoas que é uma questão genética e não de falta de educação. No entanto, quando esse posicionamento parte de quem deveria ter conhecimento é o que mais a desanima.
Desde 2012, existe a legislação que instituiu a “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”, que classifica oficialmente os autistas como pessoas com deficiência e, portanto, com todos os direitos às políticas de inclusão. Entre eles, o de atendimento prioritário. “Em consultas ele nunca teve prioridade, sempre esperou a ordem de chegada”. Para a mãe, é sempre uma luta aguardar o atendimento. “Nós temos leis que amparam pessoas com deficiência, mas diante do desrespeito, a quem recorrer para pedir socorro?”, questiona, já que as denúncias feitas nunca tiveram respostas.
Mariano menciona o avanço sobre o transtorno, mas acredita que ainda há um bom caminho a percorrer. “Eu gostaria muito que o município e o Estado trouxessem mais informação para o público em geral, falar mais sobre essa deficiência que não é tão visível, porque não é só a pessoa que tem necessidade especial, a família tem necessidade especial”, argumenta. “Fico imaginando as famílias isoladas, que não saem por conta do preconceito. Uma família sem direito a acesso a nada, impedida de ir e vir por conta da falta de acolhimento”, acrescenta.