O professor do departamento de Biodiversidade, Almir Cunico, do setor Palotina da UFPR (Universidade Federal do Paraná), afirma que a mortandade de 50 toneladas de peixes no rio Piquiri é o reflexo de todo sistema de gestão ambiental no Brasil. "É uma tragédia anunciada, pois potenciais problemas sempre são indicados por estudos e pesquisas, desde a questão de ocupação e urbanização em áreas ambientais e o uso excessivo de defensivos agrícolas que acabam indo para os corpos hídricos", destacou.

Cunico, que atua no laboratório de Ecologia, Pesca e Ictiologia (estudo dos peixes), diz que as alterações já observadas nas comunidades aquáticas da região vão desde a baixa diversidade de espécies, aumento da tolerância à poluição e alto índice de introdução de espécies que não são nativas. Já na qualidade da água, ele cita a presença de rejeitos de matéria orgânica que pode ser desde fertilizante, esgoto, rejeitos de produção animal, entre outros.

O pesquisador lembra que nos trabalhos em ambientes aquáticos há o princípio da invisibilidade. "É muito difícil observar o que está acontecendo na água até que se tenha um evento catastrófico como esse. Todas as informações que a comunidade científica publica sobre isso não é levado em consideração tanto pela sociedade quanto pelos gestores do sistema ambiental. A prevenção tem que ser levada mais a sério", criticou.

Entre as possíveis soluções, o pesquisador destaca que elas serão a médio e longo prazo. "É preciso saber a causa, pois muitas vezes ela não está no epicentro de onde ocorreu a mortandade. Depois é adotar medidas como o isolamento da vegetação ciliar para ela ir se recuperando com o tempo. Se o ambiente está bom, os peixes voltam naturalmente", sustentou. Cunico integra o movimento Pró Ivaí/Piquiri, criado pela sociedade civil organizada em 2012 pela discussão da implantação de barragens hidrelétricas nesses rios.

AMOSTRAS
A professora doutora Rosilene Luciana Delariva, da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), coordena um estudo conduzido por alunos de doutorado, mestrado e de iniciação científica, que vem coletando amostras de 26 riachos/nascentes do Estado, sendo 10 riachos que drenam para o Piquiri. O objetivo, segundo ela, é compreender as influências do tipo de uso do solo nesses locais, a qualidade da água, e os impactos sobre a estrutura das comunidades biológicos (algas, macroinvertebrados e de peixes).

As coletas já foram concluídas e os dados deverão ser publicados a partir de março de 2020. "A principal aplicação é determinar quais fatores ambientais ocorrem nesses riachos e de que forma estão interferindo na qualidade da água e da fauna, especialmente de peixes. Tendo essas informações, poderemos propor medidas de mitigação e preservação", destacou.


PREOCUPAÇÃO NOS MUNICÍPIOS
A tragédia ambiental no rio Piquiri preocupa alguns municípios da região. O secretário de Agricultura e Meio ambiente de Nova Aurora (Oeste), João Jamil Morene Bernes, foi até Curitiba para tentar viabilizar uma maneira de repovoar o rio, já que muitas espécies de peixes foram atingidas. "Nós recebemos a promessa da secretaria estadual de Meio Ambiente de que soltarão 150 mil alevinos no rio Piquiri para ajudar a recompor o volume que foi dizimado", afirma ele. A assessoria do IAP destacou que não está mais ocorrendo a mortandade de peixes e confirmou que em serão liberados 150 mil alevinos tão logo os exames da qualidade da água apontem que há segurança para isso.

A chefe da divisão de Meio Ambiente e turismo de Ubiratã, Cleide Carvalho, afirmou que a grande preocupação é em relação aos níveis de toxicidade da água. "O que o município de Ubiratã quer que se resolva é o problema da qualidade da água do rio. Nós queremos que o IAP só libere a pesca quando houver liberação da qualidade da água, já que não se pode consumir peixes que podem estar contaminados. A água também pode estar contaminada, mas felizmente a captação para o abastecimento de água é da microbacia rio Água Grande, que vai desaguar no Piquiri", relata. Segundo ela, não há pesca profissional no município.

O promotor Robertson Fonseca, que integra o movimento Pró Ivaí/Piquiri, afirma que aproveitará o episódio para propor uma discussão de medidas de controle de pesca tal qual acordadas pelo Ministério Público (Coordenação das Promotorias de Meio Ambiente da Bacia Hidrográfica, em Campo Mourão), com participação de universidades, municípios e pescadores em relação ao rio Ivaí. Ele questiona sobre quem vai fiscalizar o rio, já que a extensão é muito grande. "Será que tem gente para proibir a pesca no rio inteiro? Não adianta proibir. Tem que educar", afirma. "Os rios Ivaí e Piquiri são fundamentais para manter saudável o único trecho do rio Paraná que não tem represas, entre Itaipu e Porto Primavera, e que são fundamentais para a reprodução dos peixes", destaca.

Imagem ilustrativa da imagem 'É uma tragédia anunciada', afirma pesquisador
| Foto: Folha Arte



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