Uma das matérias que Raphael Katekaru Cândido Graciano, 21, aluno do terceiro ano do ensino médio do Colégio Hugo Simas (região central de Londrina, está estudando neste mês é o de movimentos artísticos como Cubismo e Expressionismo. Além da nova experiência com as aulas remotas (consequência do fechamento das escolas por causa da pandemia da Covid-19), Raphael é parte das histórias que estão sendo construídas entre alunos especiais, pais e professores, e que definem a palavra dedicação.

Flávia e o filho Raphael Katekaru Cândido Graciano
Flávia e o filho Raphael Katekaru Cândido Graciano | Foto: Acervo pessoal

Ele é um aluno especial porque é cego e tem autismo. Ele mora com a mãe Flavia e está estudando em casa com a ajuda a distância da pedagoga Michelle Maia Mendonça. E é a partir desse encontro que a educação ganha definitivamente o status de especial. A mãe comenta que as aulas transmitidas pela televisão ou mesmo pelo aplicativo do governo do Estado estavam sendo cansativas e ineficazes para o filho, pois não há explicações detalhadas. “Essas aulas são muito visuais e não funcionam para o Rapha. Ele não entende com tanta clareza. No início foi uma grande dificuldade encontrar uma metodologia que funcionasse bem para ele”, diz.

O desafio ficou ainda maior quando a professora de apoio de Raphael entrou em licença médica. Essa situação acabou aproximando o aluno de Mendonça, que é especialista em Educação Especial e se colocou à disposição para fazer a mediação dos professores com o aluno, em todas as 12 disciplinas. “Nós, professores, não estávamos preparados para esse trabalho e nem os pais para virarem ‘professores’. Foi preciso fazer adaptações curriculares para o Raphael conseguir acompanhar tudo, até que chegamos na ideia dos áudios”, conta.

Os professores enviam os conteúdos a serem trabalhados. Com criatividade e todas as dúvidas esclarecidas com os professores, ela grava as aulas em áudio e os manda via whatsapp. As respostas do Raphael também são gravadas e repassadas aos professores.

O jovem está em processo de aprendizagem do soroban (ábaco japonês) e da leitura em braile. “A escrita em braile ele sabe, mas agora o foco maior é na questão do ensino regular para concluir o terceiro ano e com sucesso. É um direito dele aprender e é isso que estamos tentando fazer. Como o Raphael é cego, preciso descrever tudo. Ele não conhece as cores e muitas outras coisas simples do nosso dia a dia”, comenta.

Pedagoga Michelle Maia Mendonça
Pedagoga Michelle Maia Mendonça | Foto: Acervo pessoal

Ainda de acordo com a pedagoga, nas aulas regulares os conteúdos são trabalhados na Sala de Recursos do colégio, possibilitando aos professores utilizar miniaturas para que o aluno sinta o contorno dos objetos ou fazer atividades em áreas externas, onde ele pode, por exemplo, tocar uma árvore.

GRATIDÃO E EMPATIA

Em casa, mãe e filho participam das aulas juntos e no período da tarde, revisam parte da lição do dia. Segundo Katekaru, os resultados têm sido muito bons, pois com a audiodescrição detalhada o jovem está compreendendo o conteúdo com mais facilidade. “A Michelle explica de uma forma que ele entende e o Raphael é muito inteligente. O que faltava era um método eficaz que chegasse até ele. Sou muito grata à Michelle pela empatia que ela tem não somente pelo meu filho, mas por todos os alunos que ela faz atendimento”, afirma.

PARADIGMAS

A pedagoga no ensino médio do Colégio Hugo Simas, Eliane Maria Ferreira Camargo Torelli, comenta que a educação remota derrubou uma série de paradigmas. “A visão que eu e os colegas tínhamos era de que os alunos entendiam tudo de informática e internet, mas com a educação remota não é tem sido bem assim. Percebemos que há algumas dificuldades dos alunos em acessar a plataforma ou mesmo mandar e-mails para os professores. Agora imagine para os alunos que têm necessidades especiais”, desabafa.

PROFESSORES DE APOIO

Londrina conta com aproximadamente 2.200 estudantes matriculados em todos os serviços da educação especial na rede estadual de ensino. O coordenador de Educação Especial do NRE (Núcleo Regional de Educação) de Londrina, Diogo Munhoz, explica que neste novo modelo de estudo, “os alunos estão sendo atendidos no seu processo de aprendizagem, com o trabalho colaborativo entre o profissional habilitado das Salas de Recursos e/ou o professor de atendimento educacional especializado; o professor de apoio à comunicação alternativa; o tradutor intérprete de Libras e os professores das disciplinas, para adaptações necessárias conforme especificidade e necessidade de cada estudante”.

De acordo com ele, são mais de 100 professores de apoio que atendem individualmente alunos com deficiência física e autistas. Munhoz reconhece que o ensino remoto tem sido um desafio tanto para os professores quanto para os alunos e suas famílias, e diz que cabe a cada professor, diante das orientações, avaliar as necessidades dos seus alunos e criar estratégias para atendê-lo dentro das possibilidades.

“Algumas famílias precisam que as estratégias de atendimento sejam modificadas e o tipo de comunicação mude também. Temos realizado muitas reuniões com os profissionais para ajustar o atendimento e penso que tem funcionado bem. Londrina e região contam com ótimos professores da educação especial. Não está sendo um período fácil para todos nós e temos que fazer o que está ao nosso alcance para que os estudantes que necessitam deste atendimento especializado tenham a melhor educação que possamos oferecer”, afirma.