A Clínica de Especialidades Infantis da UEL (Universidade Estadual de Londrina), conhecida como Bebê Clínica, mantém o compromisso com a saúde bucal das crianças desde 1985 e essa história não poderia ser interrompida em um momento tão delicado como o atual. Foi a partir desse pensamento que docentes do Departamento de Medicina Oral e Odontologia Infantil da universidade buscaram manter ao menos o serviço de pronto-socorro durante a pandemia da Covid-19, ou seja, sem desrespeitar as orientações de isolamento social e a suspensão de consultas eletivas.

Pamela Moraes levou a filha Julia ao PS  da Bebê Clínica: "Não teria condições de ir em um consultório particular"
Pamela Moraes levou a filha Julia ao PS da Bebê Clínica: "Não teria condições de ir em um consultório particular" | Foto: Micaela Orikasa - Grupo FOLHA

“Não é humano deixar uma criança com dor de dente e na infância se tem muitos problemas dentários. Foram muitas reuniões por videoconferência e nos foi cedido um espaço aqui na COU para trabalharmos com toda a biossegurança do ambiente”, comenta a docente Cássia Cilene Dezan Garbelini, coordenadora da Residência em Odontopediatria.

A continuidade do serviço é um alívio para muitas famílias como a da pequena Julia Souza, de 4 anos. Na segunda-feira (1) pela manhã, o pronto atendimento da Bebê Clínica foi o único serviço que ela pôde contar para aliviar a dor de dente. “Tudo o que ela comia, ela chorava de dor. Levei no posto de saúde, mas a dentista não estava lá. Eu já tinha sido atendida aqui na semana passada porque também estava com dor e hoje vim direto. Não teria condições de ir em um consultório particular”, conta a mãe Pamela Moraes.

TELEODONTOLOGIA

Enquanto Julia era atendida por residentes de plantão, sob a supervisão de Garbelini, uma outra equipe atuava em home office nos atendimentos on-line. Os serviços de teleconsulta da Bebê Clínica começaram em meados de março.

A docente explica que o canal de atendimento via redes sociais foi aberto como uma espécie de pré-triagem. “A ideia é evitar que o paciente venha à clínica sem que seja estritamente necessário. E foi uma surpresa muito boa porque tem funcionado bem. Em alguns casos, a gente até consegue orientar sobre o uso de algum medicamento e agendar uma consulta no dia seguinte, por exemplo, para evitar aglomerações”, diz.

Além das consultas, a preocupação das equipes também foi com a continuidade do Programa Educativo-Preventivo de Saúde Bucal Infantil. "Tínhamos pais que haviam participado da reunião, mas que não tinham tido a primeira consulta por conta da pandemia. Para não perder essa janela de oportunidades nesta fase em que os dentes começam a erupcionar, buscamos o contato virtual com os pais para ressaltar os cuidados sobre higiene, controle das mamadas noturnas e dieta dos bebês”, acrescenta.

DIFERENTE

Para participar da Bebê Clínica, os pais devem se inscrever quando os bebês têm entre três e cinco meses de vida. Em seguida, eles participam de uma reunião sobre o funcionamento do programa e a primeira consulta é agendada após 30 dias. A cada mês são abertas 20 vagas.

“Eu estava muito ansiosa para colocar ela no programa e deu certo. Eu nunca tinha tido uma consulta on-line. Achei muito diferente, mas foi bom. Eu gostei”, aprova a manicure Gislaine de Oliveira Silva, mãe da Antonella de Jesus.

A residente do segundo ano, Gabriela Corgozinho, diz que nunca imaginou atuar dessa forma nesse momento da vida, porém, encara a nova experiência como um desafio e uma forma de expandir os horizontes.

Garbelini ressalta que a teleodontologia ainda não está totalmente regulamentada, mas que já existem várias publicações científicas sobre. “A realidade impõe os fatos. Então, ou era isso ou era nada”, pontua.

INTERAÇÃO

Através do perfil da Bebê Clínica da UEL no Facebook e Instagram, as famílias podem interagir com os residentes de segunda a sexta, em horário comercial. Nos fins de semana, é possível receber orientações da equipe, mas somente em casos de urgência.

Gislaine Silva participou pela primeira vez de uma consulta-on line: "Achei diferente, mas foi bom"
Gislaine Silva participou pela primeira vez de uma consulta-on line: "Achei diferente, mas foi bom" | Foto: Micaela Orikasa - Grupo FOLHA

Já a comunicação por Whatsapp, segundo Cássia Cilene Dezan Garbelini, coordenadora da Residência em Odontopediatria, só ocorre depois do primeiro atendimento, ou seja, como um acompanhamento do paciente. Vale lembrar que todos os serviços on-line contam com a supervisão de docentes do departamento de Medicina Oral e Odontologia Infantil.

Como esse processo tem tido a aceitação dos pais, a Bebê Clínica agora estuda uma terceira fase, envolvendo crianças de dois e três anos de idade. Atualmente, o programa tem em torno de 1.800 crianças (de zero a cinco anos).

CAMINHO SEM VOLTA

Desde que a Bebê Clínica começou a trabalhar com as teleconsultas, a procura por informações e orientações via redes sociais só tem aumentado, segundo a docente Cássia Cilene Dezan Garbelini. Por dia, cerca de 20 pessoas buscam o atendimento on-line, sendo que deste total, cinco geralmente têm solução clínica e até dois casos demandam consulta presencial.

“Ficou faltando a parte do exame clínico, que seria a avaliação da boquinha do bebê para ver se está tudo bem, mas uma boa parte do problema foi resolvido. Acredito que a hora que essa criança voltar para nós presencialmente, será melhor do que se ela não tivesse recebido nenhum tipo de abordagem”, considera Garbelini.

Ela coordena a Residência em Odontopediatria do CCS (Centro de Ciências da Saúde) da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e comenta que a maioria das dúvidas dos pais que têm buscado a Bebê Clínica nas redes sociais é em relação ao nascimento dos dentinhos e dos traumas.

Imagem ilustrativa da imagem Atendimentos na Bebê Clínica da UEL são adaptados durante a pandemia
| Foto: Folha Arte

Segundo a professora, os casos de trauma dentário grave aumentaram cerca de 30% em relação ao período normal, isto é, antes da pandemia do novo coronavírus. Para ela, isso é um reflexo da permanência das crianças em casa o tempo todo.

Para esclarecer essas e outras dúvidas dos pais, a Bebê Clínica também passou a transmitir informações em saúde bucal por meio de transmissões em tempo real (live). “A primeira foi explicativa, detalhando o funcionamento do programa. A segunda foi sobre a rotina de higiene e em seguida, falamos sobre a dieta do bebê e cuidados na alimentação. A próxima será sobre traumatismos dentários, com orientações sobre como proceder e cuidados preventivos”, diz.

Toda essa experiência entre pais, estudantes e professores vem sendo encarado por Garbelini como um caminho sem volta. “Talvez para o futuro podemos fazer um programa mesclando o atendimento presencial e à distância. Acho que parte disso veio para ficar, pois também acredito que vai demorar para as atividades retornarem como antes”.

Para a residente em Odontopediatria, Gabriela Corgozinho, a teleodontologia é um recurso “que tem favorecido muito os pais na questão do tempo e também no deslocamento, mas apesar das telas, o contato físico nunca vai ser substituído, na minha opinião. Outro fator pertinente é a conexão da internet, que pode ser um dificultador. Mas em geral, essa experiência tem sido única e desafiadora, pois tem ampliado nossos horizontes”, afirma.

SERVIÇO : Mais informações no perfil da Bebê Clínica no Facebook e no Instagram.