Lucineia Terra, com Alessandro Masieiro Oliveira, paciente do Hospital do Câncer:"Respeitamos muito a situação do aluno; se não está bem, não tem como aprender. Trabalhamos o lado emocional"
Lucineia Terra, com Alessandro Masieiro Oliveira, paciente do Hospital do Câncer:"Respeitamos muito a situação do aluno; se não está bem, não tem como aprender. Trabalhamos o lado emocional" | Foto: Marcos Zanutto - Grupo Folha

No meio de médicos e enfermeiros, entre outros profissionais que atuam no ambiente hospitalar, alguns jalecos na cor verde clara destoam do tradicional branco na ala que atende crianças e adolescentes no Hospital do Câncer de Londrina. No caso das pessoas que usam essa vestimenta, o remédio que ministram é o ensino. São os professores que atuam no Sareh (Serviço de Atendimento à Rede de Escolarização Hospitalar) na instituição. A equipe, padrão neste trabalho hospitalar, é formada por um pedagogo e três docentes.

Além do Hospital do Câncer, o HU (Hospital Universitário) de Londrina também conta com este serviço. O Sareh é ligado à secretaria estadual da Educação e começou a funcionar em 2007. Seu principal objetivo é o atendimento educacional aos estudantes que se encontram impossibilitados de frequentar a escola, em virtude de internamento hospitalar ou tratamento de saúde. A equipe dá continuidade ao processo de escolarização ou faz a inserção ou reinserção em seu dia a dia escolar. As unidades de saúde que dispõe do serviço têm convênio com o Estado.

Os professores que atuam no serviço são divididos em três áreas: humanas, exatas e linguagens, com a subdivisão das disciplinas dentro delas. Os pacientes recebem estes docentes em seus leitos enquanto permanecerem na instituição. Tudo de forma individualizada. Também tem o trabalho domiciliar, que se diferencia. “Todos os dias, de segunda e sexta-feira, pela manhã, pego o censo do hospital para ver se existem novos alunos. Aqui não temos o professor da rede municipal, de 1º ao 5º ano. Então, atendemos estas crianças, pois, foi firmado acordo. Com isso, compreendemos até o 3º ano do ensino médio”, explica Lucinéia Terra, pedagoga responsável pelo serviço no hospital.

“Vemos se este aluno tem condições de ser atendido, qual a recomendação médica. Sendo um aluno novo, fazemos a triagem dele e da família, explicamos como funciona, colhemos todos os dados. Posteriormente, entramos em contato com a escola para termos acesso ao planejamento da escola de origem, pedimos algumas atividades para ter noção. Quando a unidade escolar não envia, a aula é elaborada a partir do planejamento da secretaria estadual de Educação, que é o mesmo para todos”, detalha a pedagoga.

A média de atendimentos por mês na instituição chega a 200, com cerca de 20 meninos e meninas, normalmente. Como o serviço depende da demanda, estes números variam. Ao final de cada aula, o professor faz um parecer, soma com a atividade realizada e encaminha para a escola de origem. “É um direito do estudante ter o ensino se ele não consegue estar na sala de aula. Mesmo doente, não perde o ano, pois volta depois para a escola para dar continuidade”, destaca a pedagoga, que atua nesta área desde 2008. O Sareh funciona no Hospital do Câncer há aproximadamente quatro anos.

SENSIBILIDADE
Além do entendimento para repassar o conteúdo, o professor que integra o Sareh precisa de uma dose de sensibilidade. No Hospital do Câncer ainda mais, já que o tratamento costuma ser por um longo período e com medicações fortes, como quimioterapia e radioterapia. “A criança ou adolescente está recebendo a quimioterapia e está em aula. Entretanto, muitas vezes ocorre dela estar vomitando ou tem outras reações e não apresenta condições. Respeitamos muito a situação do aluno. Se não está bem, não tem como aprender. Trabalhamos o lado emocional.”

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Um aluno paciente em boas condições, por exemplo, pode ter até seis aulas por dia. As disciplinas são sempre ministrada durante a tarde. Terra destaca que um dos principais desafios é ensinar com metodologia diferenciada, pois, não existe um quadro negro, por exemplo. “Precisa usar a criatividade e, constantemente, ler e pesquisar. Deve usar metodologia que desperta o interesse na pessoa. Não adianta chegar com a folha de papel e falar que hoje que vai aprender sobre isso ou aquilo”, constata.

PARCERIA
O trabalho do Sareh ainda é desenvolvido em parceria com os profissionais do hospital, como assistente social e psicólogos, para troca de informações e entendimento mútuo sobre a criança e adolescente internado. “Não é porque está estudando que vai esquecer que está doente. A quimioterapia muda humor, diminui a atenção, às vezes o aluno dorme o dia todo. O que fazemos é o resgate social da escola”, aponta a pedagoga, que com a experiência no Hospital do Câncer de Londrina não se vê desenvolvendo outro serviço que não cultive vínculos. “Pode existir a perda, mas não penso nisso. Foco que o aluno vai sair bem”, afirma.

19 UNIDADES

Atualmente, 19 unidades, entre hospitais e clínicas, mantém convênio com o Estado para contar com o Sareh, nas várias regiões do Paraná. São nove cidades, ligadas a nove Núcleos Regionais de Educação. Em 2018, no atendimento hospitalar foram 9,2 mil estudantes atendidos e 595 no domiciliar. Foram 1,7 mil professores atuando nesta área.

De acordo com a secretaria estadual de Educação, este tipo de atendimento vem crescendo nos últimos anos. Em 2017, foram 8,2 mil estudantes atendidos no hospital e 440 em casa. No ano anterior, o número foi de 7,8 mil alunos assistidos no ambiente hospitalar e 330 no domicílio.

EM MARINGÁ

Em Maringá (Noroeste), a única instituição que dispõe do Sareh é o HU (Hospital Universitário), ligado à UEM (Universidade Estadual de Maringá). O município foi um dos sete primeiros a receber o serviço quando lançado, há 12 anos. Além da pedagoga e três professores, divididos nas três principais áreas do conhecimento, um docente foi cedido pela prefeitura para abranger as crianças do ensino fundamental. O atendimento também contempla a EJA (Educação de Jovens e Adultos) e educação especial.

Por ser um hospital escola e de urgência e emergência, o prazo de permanência dos meninos e meninas que precisam das aulas é mais curto e com um rodízio frequente. A média de tempo daqueles que permanecem internados é de três a sete dias, podendo chegar, em algumas ocorrências, a 15, 30 dias. “Quando o aluno entra no internamento, conversamos com a família e apresentamos o programa. Ela precisa aceitar o filho estar doente e estudar ao mesmo tempo”, relata Ione Maria Ananinas, pedagoga responsável pelo Sareh no HU da Cidade Canção.

Nas situações em que o aluno vai ficar por mais de três dias hospitalizado, é pedido junto à escola a relação dos conteúdos da turma para dar continuidade. “Em menos prazo os professores preparam as atividades a partir do currículo do Estado. São docentes que no período da manhã atuam em colégios, então, têm experiência e noção do que está sendo aplicado a partir de cada ano”, cita. “Não aplicamos o conteúdo se o estudante está com muita dor, febre, em jejum. Não estamos para judiar, mas para ajudar e ser ponto positivo para eles. É flexível”, indica.