Qual é o seu tipo de paladar? Adulto ou infantil? Por trás dessa sua resposta existe uma série de comportamentos que foram adquiridos por conta de embalagens coloridas, restaurantes com cardápios ilustrados por personagens e a comida caseira que vem perdendo espaço pela correria diária que a vida adulta enfrenta. Mas afinal, se queremos comer com os olhos, onde é que educamos o nosso olhar?

A alimentação, seja ela saudável ou carregada de produtos industrializados, é construída por hábitos trazidos ao longo do tempo na convivência e ensinamentos obtidos entre familiares.

Imagem ilustrativa da imagem Um lanche saudável também pode ser gostoso
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Para quem tem filhos, a preocupação com o bom desenvolvimento das crianças começa no período de introdução alimentar, descoberta de sabores e até a fase onde eles finalmente já podem escolher o que vão comer.

Quando se trata de hábitos alimentares saudáveis, a escola e a creche têm um grande papel no auxílio da construção do olhar para esses alimentos. Primeiramente, todos devem estar cientes sobre o que é permitido ou não levar para consumo entre os intervalos das aulas e também ter muita atenção no que é oferecido no cardápio do refeitório e nas lanchonetes abrigadas nesses espaços.

É aí que nasce então um sistema de parceria entre família e instituição. “Sempre sugiro às famílias que uma refeição saudável e completa contemple os três grupos de alimentos, dentro da lancheira teria uma fonte de carboidrato, proteína e vegetal (fruta, legume ou verdura). Se você pensar nisso na hora de montar a lancheira escolar, é necessário parar de estereotipar os alimentos entre saudáveis e não saudáveis, todos podem ser adequados na hora certa e na proporção certa, pode ser bolo ou bolacha, mas tudo de preferência caseiro”, diz a nutricionista Valéria Arruda Mortara.

A nutricionista ressalta que para manter uma boa alimentação as regras também são necessárias, desta forma as crianças e adultos podem praticar hábitos mais saudáveis. Essa mudança para uma alimentação mais saudável envolve toda a família. “Essa transição a família só faz estabelecendo regras. Se a família come mal os sete dias da semana, pode passar a comer bem em dois dias na semana ou em uma refeição do dia. Faça essa transição de maneira suave, começando o café da manhã e o da tarde com uma fruta, por exemplo. São essas mudanças firmes que vão fazer mudar o hábito alimentar de uma criança”, ensina Mortara.

“É preciso mudar a cultura de que uma pessoa que não sabe cozinhar é bacana e aquela frase ‘eu não sei nem fritar um ovo’ deixe de ser algo bonito de se dizer. Na minha opinião culinária deveria constar no currículo escolar, porque culinária é autocuidado”, comenta a nutricionista.

Teatro e culinária despertam o interesse pela boa alimentação

A diretora e professora Bárbara Lourenço Ricardo, do Centro de Educação Infantil Crescer, utiliza várias ferramentas para despertar o gosto pelos alimentos saudáveis nas crianças, desde "teatrinho" até mesmo colocar a mão na massa literalmente para o alimento ser ainda mais atrativo. “A gente senta e agradece ao alimento, falamos para eles que comendo aquela refeição eles vão ficar bem mais fortes, que o cabelo vai ficar lindo e grande e também vão conseguir dormir melhor. O que mais ajuda nesses momentos é eles estarem sentados todos juntos para comer, assim todos ficam curiosos”, diz.

Uma tarefa difícil não somente para as crianças, mas também para adolescentes e adultos é concorrer com os alimentos hiperpalatáveis. Muitos artigos científicos já foram feitos sobre esses alimentos: chocolates, biscoitos recheados, pizzas, hambúrgueres, aqueles industrializados que causam uma explosão de sabores na boca e provocam o desejo apenas ao assistir aos seus comerciais na TV.

Mas é justamente na infância o melhor momento para exercitar a preferência por outros tipos de sabores, apresentando aos pequenos outras formas de realçar o paladar. “Para fazer eles se interessarem mais pela alimentação saudável, levamos eles até para fazer os pãezinhos", comenta a professora.

Juliana Abreu, nutricionista
Juliana Abreu, nutricionista | Foto: Divulgação

Juliana Abreu, nutricionista escolar dá atenção especial aos itens escolhidos para cada refeição: "A forma da criança se alimentar na infância, tanto em quantidade como na qualidade, vai refletir na alimentação da vida adulta. Oferecer alimentos frescos e caseiros, de todos os grupos alimentares, vegetais, legumes, frutas e grãos, sempre variando. Assim o paladar vai sendo educado”, explica.

Ana Carolina Rebellato Bertonili é mãe de Rafael, de dois anos. “Desde pequeno incentivei a alimentação saudável no Rafael, tenho mais dois filhos e sempre procuramos nos alimentar bem, já fazem uns dois anos que não compramos açúcar em casa, por exemplo. Eles já se habituaram, então quando fui procurar uma escolinha para o Rafa, busquei uma que desse sequência ao que fazemos em casa, isso também foi levado para escola. É também uma ajuda na rotina da criança, porque sem isso ela não evolui nos hábitos, lá ele tem os intervalos de café da manhã e almoço, eu fico bem tranquila”.

Rafael, de dois anos
Rafael, de dois anos | Foto: Divulgação

O assunto “culinária” está na TV, podcast, virais na internet, mas ainda está longe de ser discutido com tamanha importância dentro dos lares brasileiros. O grande estímulo de consumo de alimentos ultraprocessados ganha espaço e é preocupante. “O papel das escolas infantis é muito importante, pois é nela a criança faz boa parte de suas refeições e, muitas vezes, em casa não tem a mesma variedade nem um cardápio nutricionalmente calculado”, observa Juliana Abreu.