A cerimônia do chá transformou em um ritual baseado em quatro valores: harmonia, respeito, pureza e tranquilidade
A cerimônia do chá transformou em um ritual baseado em quatro valores: harmonia, respeito, pureza e tranquilidade | Foto: Roberto Custódio



Imagine ficar completamente nu na frente de um monte de estranhos para tomar um banho quente. Esta é a regra para entrar no onsen, termo japonês para água termal. O nome é usado para identificar as casas de banho coletivas, com águas naturais ou artificiais, que estão espalhadas por todo o país. A tradição é milenar e surgiu em locais com água termal vulcânica ao ar livre. A intenção era aproveitar as propriedades medicinais.

A vice-presidente da Acel (Associação Cultural e Esportiva de Londrina), Helena Harumi Ota Kitahara, que tem visitado o Japão com frequência nos últimos anos, conta que "não encarou" a experiência logo na primeira oportunidade. "Eu fui com as minhas amigas e não quis entrar", confessa. Da segunda vez, porém, não resistiu. Na companhia das irmãs, decidiu aproveitar a estrutura privativa oferecida pelo hotel em que estava hospedada, e que separa os ambientes entre homens e mulheres, para se banhar. "É muito bom", garante.

Nas suas andanças pelo país, Helena diz ter percebido que muito da cultura preservada pelos descendentes no Brasil já se perdeu no Japão. Ela conta, por exemplo, que não é fácil encontrar quimonos, vestimenta tradicional utilizada por mulheres, homens e crianças. E quando se encontra, eles são muito caros. Ela também teve dificuldade para achar o koto, um instrumento musical de cordas japonês que ela toca no Brasil. "Perguntei a uma senhora dentro do shopping e ela respondeu que tem 74 anos e nunca viu um koto", lembra.

Ao procurar um tipo de corante utilizado em conservas japonesas que ela prepara em casa, Helena também se surpreendeu. Ouviu da lojista que o artigo não era vendido, pois ninguém mais o comprava. "As japonesas não cozinham em casa. Elas compram tudo pronto", relata. A ocidentalização da cultura e a "maquiagem" nos pontos turísticos chamaram a atenção da visitante. Para quem pretende visitar o país, ela tranquiliza. Existe muita comida boa e esteticamente atrativa na terra do sol nascente.

A professora Luzia Mitsue Yamashita Deliberador também já visitou o país algumas vezes e relata que guardou na memória um evento bastante simbólico e significativo da cultura celebrado em janeiro. Seijin Shiki é um feriado nacional em que se comemora o Dia da Maioridade no Japão. "Todos os jovens que acabaram de completar 20 anos são chamados para participar da festa", explica. A data é muito importante, pois representa a transição para a vida adulta. As moças usam quimonos finos de seda e os rapazes vestem hakama e haori, saia-calça e jaqueta, respectivamente. Alguns dispensam o traje tradicional e preferem usar terno e gravata. "Essa festa foi uma das coisas mais bonitas que eu vi", garante.

Uma das atitudes que chamou a atenção do membro do Comitê Gestor IntegraNikkey, Luciano Matsumoto, foi o respeito às regras e ao próximo. "Percebi que ninguém fala ao celular no trem. Eles usam uma cabine para não incomodar as outras pessoas", conta. Para atravessar a rua, ainda que tarde da noite e nenhum carro por perto, ninguém coloca o pé na faixa. Todos esperam o sinal abrir para a passagem do pedestre. A mistura de elementos tradicionais e contemporâneos é outra característica marcante, segundo Matsumoto. "O próprio onsen é algo impensável de ser concebido no Brasil", opina.

CERIMÔNIA DO CHÁ
Praticado há séculos no Japão, a cerimônia do chá é considerada uma arte do caminho, da expressão artística e filosófica, e da evolução espiritual. A professora e especialista na prática, Toshiko Ogatta, conta que o matcha – chá verde em pó - foi levado ao Japão por um monge budista, que experimentou a bebida na China. No início, era vendido a preço de ouro no país, mas com a popularização do cultivo, tornou-se acessível à maioria da população.

A degustação da bebida se transformou em um ritual baseado em quatro valores: harmonia, respeito, pureza e tranquilidade. Os itens de decoração e as louças são escolhidos com cuidado. Toshiko explica que, na cerimônia, que pode durar cerca de quatro horas, não existem títulos nem classe social, apenas disciplina e respeito. Apesar de ter influência budista, a professora ensina que não se discute sobre religião na sala de chá. A cerimônia representa um momento de meditação, contemplação da natureza e da arte. "É muita paz diante de uma xícara de chá", descreve.