Alunos e professores precisaram se acostumar a uma nova rotina escolar devido à pandemia
Alunos e professores precisaram se acostumar a uma nova rotina escolar devido à pandemia | Foto: iStock

A discussão não é nova, mas foi na pandemia do novo coronavírus que as competências preconizadas pela BNCC (Base Nacional Curricular Comum), homologada em 2017, passaram a ser articuladas com maior consistência.

Com a suspensão das aulas presenciais, a competência digital (que se refere sobre o uso de tecnologias digitais no processo de ensino e aprendizagem), foi a maior delas. Ao todo, a BNCC, prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Plano Nacional da Educação, traz dez competências para nortear os currículos dos sistemas e redes de ensino das escolas públicas e privadas brasileiras.

Com alunos e professores tendo que se adaptar à uma nova rotina escolar devido à pandemia, novos paradigmas na educação foram construídos ao longo de 2020 e a expectativa para 2021 é a consolidação desses modelos.

A FOLHA conversou com a fundadora e diretora do CEIPE-FGV (Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas) do Rio de Janeiro, a professora Claudia Costin, sobre a efetividades das ‘novas’ metodologias.

Ela dá início à conversa citando um exemplo do Uruguai - país vizinho bem menor em relação ao Brasil - que implantou um plano central e completo na utilização de ferramentas tecnológicas de ensino e de preparo dos professores para esse novo tipo de abordagem. Segundo ela, foi um dos países que teve menos dificuldade na pandemia para garantir a aprendizagem dos alunos em casa.

“É claro que mandar cadernos para as casas dos alunos já possibilita algum aprendizado, mas isso exclui um elemento importante que é a interação síncrona. A vantagem das plataformas digitais e de recursos parecidos, utilizados na pandemia pelas escolas, é que o aluno pode interagir com seus colegas e o professor ao mesmo tempo que surgem as dúvidas, além do fato de manterem o vínculo com a escola”, pontua.

No Brasil, Costin destaca que a apesar das escolas já terem começado a introduzir nos currículos algo que dialogasse com a base digital, esse processo estava lento. “O que pandemia fez foi acelerar isso, só que acelerou sem condições de fazer formações sólidas aos professores e sem que a gente pudesse garantir a conectividade de todos os alunos.”

Essa ‘aceleração’ é ponto positivo na avaliação da especialista, assim como a quebra de barreiras que a internet traz, democratizando o acesso ao saber. Outra consideração que ela faz é sobre as comunidades virtuais que foram criadas por professores, ao longo da pandemia, para a troca de planos de aulas e de feedback.

Para dar um exemplo, Costin cita o Centro de Mídias, que surgiu há cerca de 20 anos em Manaus para atender jovens ribeirinhos que estavam chegando ao ensino médio. “Como não tinha como transportar professores de cada disciplina para cada aldeia semanalmente, muitas aulas passaram a ser transmitidas via satélite para todas as aldeias que não têm necessariamente uma estrutura de escola nas proximidades. Um professor generalista mantém o contato fixo com os alunos, mas os demais davam aulas pela televisão”, conta.

A iniciativa foi considerada como uma das 14 melhores práticas do mundo de aprendizagem em escala, ou seja, que chega a amplos territórios e isso, segundo Costin, “ajudou muito no período de isolamento da pandemia porque trouxe praticidade não só para o estado do Amazonas, mas para a própria cidade de Manaus porque muitos alunos já tinham o hábito de assistir aulas pela televisão.”

VOLTA ÀS AULAS

Levando em consideração esse ‘empurrão digital’ que alunos, professores e escolas tiveram nos últimos meses, o próximo passo seria consolidar essas metodologias. Para isso, a especialista defende o desenvolvimento da competência digital e alguns conceitos educacionais.

“O que nós precisamos agora no processo de pensar o retorno às aulas e, que muito provavelmente será em regime de rodízio de alunos, é preparar os professores para esse novo processo, além dos próprios alunos e as famílias para que dentro das condições sociais e de recursos de cada um, eles possam ter o máximo de aprendizagem”, pondera.

Costin ressalta que não basta instrumentar os alunos com aparelhos digitais se não houver uma pedagogia consistente. “A educação é um processo essencialmente humano. O professor tem um trabalho muito importante que é ensinar o aluno pensar de forma independente, trazer sua contribuição já refletida para um trabalho em equipe, e isso tem que ser incorporado no plano de aula do professor, na sua atuação”, diz.

Para ela, o que tem funcionado nos últimos tempos e que precisa ser absorvido pelas instituições de ensino é o conceito de sala de aula invertida - quando a aula acontece em casa e a aplicação dos conceitos aprendidos acontece em sala de aula.

Porém, para isso funcionar o professor tem que estar capacitado em metodologias ativas. “Que é um tema na educação um pouco mais ‘mão na massa’. Não só aplicando o conceito, mas prototipando soluções. Isso será muito importante na volta às aulas. Todos tiveram que sair da zona de conforto e se reinventar profissionalmente nos últimos tempos. Não tem sido simples para ninguém”, diz.

GANHO NO APRENDIZADO

O conceito de sala de aula invertida já é uma realidade no Colégio Positivo e a experiência permite ao diretor-geral Celso Hartmann, destacar que o ganho de aprendizado tem sido muito grande entre os alunos e professores.

“O aluno passa a ser efetivamente protagonista em relação ao aprendizado e essa prática acabou virando uma realidade muito rapidamente. A pandemia nos ensinou que tudo pode mudar rápido e os recursos tecnológicos já são aplicados no Grupo há muito tempo”, diz.

A expectativa do diretor é que, “dentro do possível e de todas as regras de segurança, as aulas tenham um retorno de 100%, mas com a possibilidade de assistência em casa”.

Ainda de acordo com Hartmann, considerando o modelo de ensino híbrido, o Grupo Positivo fará a transmissão da sala de aula para os alunos que estiverem em casa, com um professor auxiliar para intermediar a comunicação deles com o professor em sala. “É uma forma de asseguramos uma melhor qualidade no atendimento aos alunos”.