Em todo o Brasil existem apenas 18 paróquias da igreja ortodoxa. Dessas, a metade está no Paraná, onde a maioria dos imigrantes ucranianos desembarcou, em busca de uma vida nova, a partir dos últimos anos do século XIX.
No Norte Pioneiro, eles começaram a chegar a partir de 1924 e se estabeleceram na região de Joaquim Távora. Ali, fundaram a Colônia São Miguel, que chegou a agrupar mais de 50 famílias. Quem sabe toda essa história e a conta para a FOLHA é a professora Maria Miskalo, 75 anos.
Filha de um casal de ucranianos, ela passou boa parte de sua vida na colônia, celebrando os costumes da terra natal de seus pais e aprendendo a amar o Brasil, lição que o patriarca fazia questão de transmitir aos filhos. ''Para os ucranianos, tudo era muito difícil naquele começo. Mas eles tinham força de vontade e uma grande fé na providência divina. Por isso, quando começaram a vencer os problemas materiais, sentiram falta da espiritualidade. Então, iniciaram a procura por um padre ortodoxo'', relata a professora.
Em 1927, vindo de Santa Catarina, o padre Nicolau Ziondra foi o primeiro religioso ortodoxo a visitar a Colônia São Miguel, que a partir daí começou a receber visitas regulares de padres que vinham até de outros países para celebrar por ali.
Hoje, as famílias ortodoxas de Joaquim Távora são apenas oito. ''Muitas foram para cidades maiores como São Paulo e Curitiba'', conta Maria Miskalo. Porém, mesmo que a comunidade tenha diminuído, os ortodoxos deixaram traços sólidos de sua cultura cravados naquelas terras. Ali estão uma das poucas igrejas e um cemitério ortodoxo do nosso país.
O templo começou a ser construído em 1946, por iniciativa do padre Basílio Postolan, que - para animar a comunidade - fez a primeira doação em dinheiro. Logo, a capela de São Nicolau - santo muito conhecido no mundo oriental - estava pronta e as terras do cemitério compradas.
Construída de madeira, a igreja resistiu a uma mudança de lugar devido a alterações no traçado da estrada que liga Joaquim Távora a Guapirama e praticamente corta a colônia dos ortodoxos. Isso fez com que o templo fosse desmontado e reconstruído novamente alguns metros adiante.
''As tábuas ainda são todas originais'', destaca o empresário Taras Ovçar, um dos descendentes de ucranianos que continua morando na Colônia São Miguel. Atualmente, a igreja serve a duas religiões. Todos os meses a Igreja Católica a utiliza para celebrar missas e, pelo menos uma vez por ano, o bispo da Igreja Ortodoxa - que tem sede em Curitiba - vem até o Norte Pioneiro e celebra o rito oriental. ''Nossa igrejinha deve ser a única que serve a duas religiões. É um ecumenismo de verdade'', orgulha-se a professora Raquel Ovçar, esposa de Taras.
Por dentro, de acordo com o especialista em arte sacra Sergio Ceron, a igreja não tem todos os elementos de um tradicional templo ortodoxo. Porém, um ícone moderno da Virgem Maria dá o tom da arte religiosa utilizada no catolicismo oriental. Além disso, a cruz dos ortodoxos, que também está muito presente no cemitério da Colônia São Miguel, é diferente daquele crucifixo utilizado pelos católicos apostólicos romanos e tem uma série de significados.
''A cruz mais difundida na ortodoxia é a de oito braços. Sobre a haste vertical encontram-se três travessões horizontais. O maior, que fica no centro, é onde os braços de Jesus foram estendidos. O superior lembra a tábua com as inscrições que Pilatos mandou colocar sobre a cruz. A haste inferior serviu como apoio aos pés de Cristo. Um de seus extremos está um pouco mais elevado, apontando para o céu, para onde se dirigiu o 'bom ladrão', crucificado com Jesus. O outro extremo, ao contrário, está direcionado para baixo, o lugar destinado ao ladrão que não se arrependeu'', explica Ceron. (W.S.)