Fernando Naporano não gosta de ser fotografado. Só aceita posar depois de alguma insistência. Também descarta aparecer com sua coleção de milhares de LPs, CDs, K-7s e DVDs. ‘’Isso é um clichê, deixo para o Fábio Massari’’, diz, citando o ex-VJ da MTV, notório por sua discoteca reforçada.
Ele segue dirigindo a rápida sessão. Faz questão de sair nas fotos acompanhado da cadela Melody. E também de fumar. ‘’Sou politicamente incorreto. Faço propaganda mesmo. Adoro cigarro!’’.
Naporano foi um dos maiores críticos musicais do país a partir dos anos 80. Seus textos para o jornal Folha de São Paulo e a revista Bizz combinavam personalidade forte e muito conhecimento de causa. Em paralelo, liderava o Maria Angélica Não Mora Mais Aqui, hoje lembrado como uma cult band que inaugurou o expediente de cantar em inglês no underground brasileiro.
Quando saiu do país, no início da década seguinte, virou correspondente de veículos como O Estado de São Paulo, Correio Braziliense e Rede Globo, além de colaborar com publicações estrangeiras. Ainda trabalhou para a gravadora Continental, negociando os direitos de discos brasileiros para os mercados europeu e asiático.
Foram 13 anos em Londres e dois nos EUA. Naporano só voltou ao Brasil em 2004, para ficar mais perto da filha, que mora em São Paulo com a mãe. Até tentou viver novamente na capital paulista, mas não se adaptou. ‘’Escreva o que eu vou dizer, por favor: São Paulo É uma cidade aflitiva, suja e cara’’, afirma, na primeira das várias ênfases da conversa.
Em seguida, mudou-se para Florianópolis (SC) e, enfim, Curitiba, onde encontrou o equilíbrio entre qualidade de vida e proximidade da filha. Considera-se aposentado, apesar de fazer eventuais trabalhos de tradução. ‘’Tenho nojo de me envolver com as coisas vigentes. As diretrizes da imprensa cultural atual são estupidamente medíocres’’.
Lendo assim, pode parecer que Naporano é um sujeito amargo. Mas suas tiradas, mesmo as mais agressivas, contém um humor ácido, impagável. Exemplos não faltam.
‘’Prefiro dar vassouradas na minha mãe do que assistir a esses festivais corporativos’’, diz, sobre os shows internacionais patrocinados por grandes empresas. ‘’Não vou jantar com um gordo desgraçado só para convecê-lo a lançar um livro sobre o rock psicodélico do Texas’’, dispara, quando o assunto são os projetos que gostaria de desenvolver - e sua inaptidão para lidar com o ‘’mundo real’’, como ele mesmo admite.
Casado há dois anos com a incrivelmente jovem Bianca, o jornalista passa o dia lendo nos parques da cidade. Pesquisa poesia, cinema e praticamente todos os gêneros de música. Tem vários livros prontos, mas quer mesmo é relançar a obra do Maria Angélica, ainda inédita no formato digital.
‘’Procuro um mecenas para produzir uma caixa com quatro CDs e um livreto contando a história da banda. Tem de ser uma coisa luxuosa, em respeito ao público. Do contrário, não faço’’, afirma.

Paixão pelo futebol
Outra de suas paixões é o futebol. Torcedor incurável do São Paulo e do Everton (Inglaterra), assiste a jogos de todos os cantos do mundo. ‘’Luto contra o tempo para dar conta de ver, ler e ouvir tudo o que me interessa. É meio neurótico, uma necessidade física’’, confessa, cercado por estantes lotadas.
Aliás, a casa espaçosa, no bairro do Seminário, é um verdadeiro museu. Só de LPs e CDs, são cerca de 25 mil. Todos devidamente organizados - em ordem alfabética e divididos em categorias extremamente pessoais, como ‘’60’s Westcoast Sounds’’, ‘’70’s Europe’’ e ‘’Italian Stuff’’.
Antes de encerrar o papo, insisto em saber sua idade, que ele não revela de jeito nenhum (há quem diga que Naporano tem 46). ‘’Escreva aí: idade inconfessa. Porque não acredito em drama de geração, nesse negócio de que ‘no meu tempo era melhor’’’, diz. ‘’No Brasil, há essa mania de dizer que o jovem é burro, não pensa. A Bianca só tem 20 anos e é um gênio’’, completa.
Curitiba deve ser mesmo a cidade perfeita para quem quer se esconder. Só aqui uma figura dessas continua anônima...