Quando economia, política e demagogia se juntam

Aproxima-se a época em que veremos discursos inflamados com soluções fáceis para a economia calcados na premissa de que o que falta é "vontade política" para combater o desemprego e gerar riqueza.
É fundamental que não nos deixemos iludir com falsas promessas e demagogia barata e ajudemos a alertar a quem nos é próximo.

Uma regra de ouro...
Só é possível consumir aquilo que foi produzido. Escrito de outra forma, a capacidade de demanda está limitada pela capacidade de produção.
Portanto não é possível aumentar a capacidade de demanda se não existir a contrapartida no aumento da produção para atendê-la.

... e o obvio ululante
Se, por qualquer razão, a demanda aumentar mais que a produção o único resultado que se pode esperar é um processo de inflação.
Em ‘economês’: haverá o expurgo da demanda via preço.

A demagogia de ‘dobrar’ o salário ...
Entender esse conceito é fundamental porque não faltaram no passado e não faltarão no futuro, candidatos apregoando em cima de palanques, que basta dobrar o valor do salário mínimo para que a economia volte a crescer.

... e a ‘lógica’ que alicerça a pregação
O discurso é que ganhando o dobro, o trabalhador consumirá o dobro exigindo que a produção também dobre e assim precisará contratar mais, o que significará mais renda e mais consumo fazendo a economia entrar em um ciclo virtuoso.
E o menos avisado pensa: ‘faz sentido’.

Duas razões para esta ‘lógica’ ser um embuste
Primeiro porque um aumento nos salários significa aumento nos custos de produção que serão repassados para os preços.
Isso ocorre porque os custos são ‘ex ante’, ou seja, quem produz já sabe que deverá pagar mais em salários e coloca estes custos no preço final do produto.
Os salários por sua vez, são pagos ‘ex post’, ou seja, o trabalhador só os recebe depois de realizada a produção.

A produção não cresce da noite para o dia
Segundo porque um aumento na produção não é imediato. É preciso fazer investimentos em máquinas, prédios, contratar mais matéria-prima, e nada disso acontece de imediato.
E mesmo que algum setor tivesse ociosidade para simplesmente aumentar a produção contratando novos empregados o mesmo não acontece, por exemplo na agricultura. Não dá para forçar o pé de feijão a entregar seus grãos antes da hora.

O resultado é desastroso ...

A consequência imediata de aumentos no salário mínimo sem que a oferta de produtos tenha ocorrido na mesma proporção somente gerará aumento nos preços.
O trabalhador ganhará mais, mas não terá qualquer aumento em seu poder de compra.

... e se propaga por toda a economia
E esse processo de aumento cria uma instabilidade em todo o sistema. Os insumos sobem de preço porque o salário subiu. Quem compra insumos, além de arcar com o aumento dos salários precisará aumentar mais ainda o preço final pois sua matéria-prima subiu.
A economia entra em uma espiral inflacionária que já vivemos no passado. Esta é a receita perfeita para o desastre.

E quando aumentar salários...
O aumento real de salários (aquele que aumenta o poder de compra e não somente repõe perdas), só pode ocorrer pelo aumento da produtividade.
Cada trabalhador aumentando sua capacidade de produção gerará as condições para aumentar na mesma proporção sua capacidade de consumo.

... e como aumentar a produtividade
Aumento da produtividade se consegue por meio de investimentos em educação, tecnologia e infraestrutura.

Na dúvida, olhe sempre a regrinha de ouro
Qualquer proposta para a economia precisa passar primeiro pela regra de equilíbrio entre consumo e produção. Um só pode crescer se o outro crescer junto.
Se respeitada essa regra, aí sim vale a pena se debruçar para estudar melhor uma proposta.
O resto é falácia.

Marcos J. G. Rambalducci, economista, é professor da UTFPR. Escreve às segundas-feiras.