Cambé - Estar nas passarelas sempre foi um sonho de infância de Fernanda Santos, hoje com 16 anos. “Comecei como miss quando era pequena, por meio da miss Paraná 2017, mas conta do bullyng desisti do meu sonho e voltei agora”, conta. O retorno foi em grande estilo. A adolescente conquistou em setembro o título de Miss Cambé Teen. A jovem mora em Cambé (Região Metropolitana de Londrina).

A coroa a levou para a disputa do Miss Paraná Teen, no último dia 21 de outubro, em Umuarama (Noroeste). Mas foi no concurso que almejava chegar que viveu o pesadelo do preconceito. “Estava no meu quarto fazendo o cabelo e a maquiagem, olhei no meu celular e no grupo das misses estavam falando sobre uma sabotagem, no entanto, tinham apagado as mensagens”, relata.

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Ao ligar para a amiga que também participava no evento para entender o que estava acontecendo, ficou sabendo das postagens de teor discriminatório. “Ela me disse que me chamaram de macaca. Fiquei muito abalada”, emociona-se. Além da injúria racial, a publicação também dizia que a adolescente "nem deveria estar no concurso tirando a vez das outras".

O mesmo texto foi enviado por meio de uma rede social para o namorado da jovem, num perfil até então desconhecido. “Tentei conter as lágrimas, porque tinha um objetivo. Estava lá por algo que batalhei muito. Foi difícil passar por isso. Segurei o que estava sentido”, destaca. “Desde o começo do concurso minha mãe me treinou para caso acontecesse alguma sabotagem, mas não um ato racista”, acrescenta.

A mãe acompanhava a adolescente e foi quem a amparou antes dela desfilar na final. “Falei que ela precisava ser forte para subir naquele palco, que precisava representar as mulheres pretas, para mostrar que ali era o lugar delas também. Prepararei minha filha para tudo que poderia acontecer, mas não preparei minha filha para ser vítima de racismo”, lamentou a assistente social Tatiane Ribeiro dos Santos.

A adolescente e a família não sabem quem praticou a injúria. O caso foi levado à Polícia Civil de Cambé. “Fizemos o BO (Boletim de Ocorrência). Temos prints e acredito que vamos conseguir descobrir quem foi que fez isso, porque precisa ser punido. Não podemos continuar vivendo com isso, com nossos filhos não podendo participar de eventos por medo (de serem vítimas de racismo e injúria)”, ressalta Tatiane.

ORGANIZAÇÃO DO EVENTO

Sem citar especificamente o caso de Fernanda, a organização da festa se manifestou, por meio de nota, dois dias após o desfile. No texto, intitulado de repúdio, a PróArte Eventos disse que "repudia a discriminação racial e não compactua com nenhuma forma de discriminação ou preconceito.”

INDIGNAÇÃO

Com mais de 25 anos dedicados à área de eventos e trabalhando com misses, Glacimeire Cardoso, coordenadora e mentora da adolescente, frisou que nunca havia se deparado com um episódio discriminatório tão explícito. “Foi assustador ter que empoderar a pessoa para ela estar firme, forte, preparada, buscando a coroa e ao mesmo tempo isso acontecendo, dilacerando corações e deixando todos realmente indignados.”

Fernanda terminou o Miss Teen Paraná entre as dez primeiras colocadas e com a faixa de Miss Elegância. Com uma carreira pela frente, espera lutar contra o preconceito. “É um momento muito difícil na vida de todos, mas temos que continuar sendo fortes. Tinha meu sonho, tentei me fazer o mais forte possível. Se a pessoa tem um sonho, que tente ao máximo, porque situações assim, infelizmente, vão acontecer, mas precisamos nos empoderar”, refletiu.

O QUE DIZ A LEI

A legislação brasileira classifica como injúria racial a ofensa praticada contra alguém em razão da raça, cor, etnia ou origem, enquanto que o racismo é a discriminação praticada contra uma coletividade. No início do ano, a injúria foi equiparada ao crime de racismo e a pena que era de um a três anos de prisão passou a ser de dois a cinco anos de detenção.

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