Assentados do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) de Londrina e de outros 13 municípios da região inauguraram, nesta sexta-feira (15), agroindústria de derivados de milho livres de transgênicos da Copacon (Cooperativa Agroindustrial de Produção e Comercialização Conquista), localizada no Assentamento Eli Vive 1, no distrito de Lerroville, extremo sul de Londrina.

A unidade, um marco na estruturação econômica da comunidade, tem capacidade de beneficiamento de 24 toneladas por dia e a expectativa é alcançar a produção de um milhão de toneladas de não transgênicos e agroecológicos ao ano. A estrutura atual já garante a comercialização de fubá, farinha de milho, biju, canjica amarela e canjiquinha xerém. Os resíduos serão transformados em ração para bovinos e suínos.

“A cooperativa já vem há mais de sete anos no trabalho com milho. Nosso início de tudo foi com a semente de milho crioulo. Participamos de vários projetos de fabricação e distribuição de sementes crioulas e, a partir dessas atividades que a gente teve, dos nossos 350 associados à cooperativa, conseguimos criar a agroindústria de derivados de milho”, disse o presidente da Copacon, Fábio Herdt, um dos assentados no Eli Vive. “A gente tem a perspectiva de trabalhar com o milho livre de transgênicos e dar os próximos passos para a transição para a agroecologia para, nos próximos períodos, a gente ter um milho orgânico, livre de transgênicos, de acesso à população.”

Para os próximos anos, segundo Herdt, o objetivo é ampliar a diversidade de produtos beneficiados pela agroindústria, com a produção de quirera, canjica branca e flocão. A nova unidade representa aos agricultores associados à Copacon um meio mais eficaz de escoar a produção, com mais qualidade e valor agregado. Além de melhorar a renda dos produtores, a agroindústria permite também um maior controle sobre a produção. “A cooperativa se encontra no centro do assentamento e isso diminui muito os custos com logística. E os produtores que trabalham na transição para a agroecologia e também na produção do milho livre de transgênicos, têm aí um acréscimo de valor por saca de milho. São bonificados por essa produção”, destacou o presidente.

Atualmente, a principal via de comércio da produção do assentamento é o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), programa federal que promove a agricultura familiar e garante a alimentação nas escolas. Em Londrina, os mais de 50 mil alunos da rede municipal de ensino são alimentados com produtos provenientes da agricultura familiar. Hoje, 30% dos alimentos consumidos na merenda das crianças são comprados pela prefeitura de pequenos produtores, um investimento anual de R$ 1 milhão. Mas a partir de 2023, a agricultura familiar irá fornecer 100% dos produtos que compõem a merenda escolar, conforme anunciou o prefeito Marcelo Belinati na solenidade de inauguração da agroindústria. "Primeiro, pela qualidade dos produtos que vocês produzem e, segundo, pelo trabalho que vocês desenvolvem, que é uma coisa linda. Gera desenvolvimento econômico e o social."

Aos poucos, os alimentos cultivados pelo MST também vão ganhando espaço no comércio convencional e aparecem com mais frequência nas prateleiras dos supermercados. “A gente quer que nosso produto, além de ser livre de transgênico, com redução ao máximo ou 100% de agrotóxicos, que ele também chegue à população com preço justo. A gente quer colocar o nosso produto saudável no mesmo valor dos produtos derivados de milho transgênico que são comercializados nos mercados da região”, disse Herdt.

INVESTIMENTO

Para colocar a agroindústria em funcionamento, foram investidos cerca de R$ 5 milhões. A maior parte desse valor veio de recursos próprios da comunidade e do Finapop (Financiamento Popular da Agricultura Familiar), movimento popular de captação de recursos para serem investidos na agricultura familiar. Cerca de R$ 600 mil foram liberados pelo governo do Paraná.

Além da estruturação econômica da comunidade, a Copacon desempenha também uma função social voltada à geração de renda aos filhos dos assentados. Cerca de 20 jovens da comunidade são funcionários da cooperativa e desenvolvem tarefas diárias, tanto na produção quanto no recebimento, fabricação, secagem dos grãos e entrega dos produtos nos estabelecimentos comerciais.

"(A agroindústria) vai atender um nicho de mercado importante tendo um alimento saudável, puro", ressaltou o chefe da Casa Civil do Paraná, João Carlos Ortega, que representou o governador Ratinho Junior no evento. Ele destacou ainda a importância do empreendimento na vida dos associados à Copacon. "Aqui é um modelo realmente de Reforma Agrária e de assentamento que dá certo."

Chamado para dar a bênção ao novo negócio dos assentados, o arcebispo de Londrina, dom Geremias Steinmetz salientou a luta do MST pela Reforma Agrária e pela justiça e paz no campo. Filho de pequenos produtores rurais, ele lembrou do quanto é importante a organização de quem trabalha com a agricultura familiar e destacou o que ouvia em seus últimos anos de estudos preparatórios para o ministério sacerdotal na convivência com o bispo de Chapecó na época, dom José Gomes, bastante atuante nos movimentos populares. "Todos nós temos muitos direitos e a Constituição de 1988 garantiu outros direitos mais. Seria natural ao governo garantir esses direitos às pessoas. Quando esses direitos não vêm, eles têm que ser garantidos ao nosso povo pela força da organização, pela força da luta popular", recordou o arcebispo.

HISTÓRIA

Criado em 2009, o assentamento Eli Vive é formado por 501 famílias e cerca de três mil moradores. É a maior área de Reforma Agrária localizada em região metropolitana do Brasil, com 7,5 mil hectares. Desde o início, as famílias assentadas produzem para o auto sustento e para a comercialização. Entre as linhas de produção, se destacam o leite, as hortaliças, o café, a panificação, frutíferas e grãos, principalmente milho. Parte dos lotes já conquistou a certificação de produção orgânica e agroecológica, projeto que tem crescido na comunidade.

Na última safra, a Copacon comercializou 15 mil sacas de milho, dez mil de soja e dez mil de feijão preto e carioquinha. Outras 15 toneladas de alimentos são entregues na Ceasa (Central de Abastecimento) toda semana, além da comercialização de 80 mil litros de leite por mês. Por meio do PNAE, todas as semanas são entregues dez toneladas de alimentos para serem servidos como merenda aos alunos de mais de cem escolas públicas de Londrina e região. Uma padaria comunitária, coordenada por mulheres assentadas, também fornece itens de panificação para a alimentação escolar.

Paraná tem 60 cooperativas em áreas de Reforma Agrária

A agroindústria da Copacon é uma das 60 criadas em áreas da Reforma Agrária no Paraná, entre laticínios, padarias e agroindústrias de beneficiamento. Essas unidades estão ligadas a 24 cooperativas da Reforma Agrária, formadas por sete mil famílias espalhadas por 200 municípios paranaenses.

Ao todo, mais de 50 produtos são industrializados em áreas da Reforma Agrária, entre café, hortifruti, erva-mate, mel, suco, milho e grãos em geral, além de derivados de cana de açúcar.

A produção é distribuída ao mercado convencional, mas também é comercializada em feiras e diretamente ao consumidor. Os alimentos chegam também ao PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar). Atualmente, as cooperativas e associação da rede de reforma agrária são responsáveis pela execução de 22% dos recursos destinados à compra de merenda escolar da agricultura familiar pelo Estado.

Em todo o Paraná, os alimentos produzidos nos assentamentos da Reforma Agrária chegam a mais de mil escolas estaduais, beneficiando cerca de um milhão de estudantes da rede pública.(Reportagem Local)

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